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Wednesday, July 31, 2013

A LIÇÃO DAS RUAS - Hamilton Alves


Sempre penso que se
puder descobrir algo
de essencial à existência
isso acontecerá à noite;

A noite igualiza os homens
e por isso atua como a mais
perfeita das democracias,
regimes políticos à parte;

E à noite, se isso ocorrer,
há de ser numa bela rua
erma, de preferência às
escuras, no silêncio que

As árvores banhadas de luz
artificial, sem pássaros,
mesmo os que vagam à noite,
produzem nas ruas periféricas;

Sempre estou muito perto
do mistério (ou essência)
das coisas quando corro
as ruas solitárias à noite;

Alguma coisa sugerem, o
recolhimento necessário à
busca, - a verdade emana,
ao visto, das mil e uma

Possibilidades que um homem
percorrendo-as possa, súbito,
encontrar uma espécie de fio
de novelo em que se enreda,

A indecisos passos lentos,
na vastidão do cosmos,
da qual a própria rua
é uma espécie de complemento.


Tuesday, July 30, 2013

DIVAGAÇÃO SOBRE A NOITE - Hamilton Alves


Deparo a noite
com seus sortilégios
costumeiros;

Palavras ecoam
aos meus ouvidos
vindas do ar

Ou das distâncias
imensuráveis, como
se fossem confidentes

Dos Deuses, que
a esta hora
avançada da noite

Pretendessem revelar
os segredos recônditos
das almas ou ainda

De alguma maneira
quisessem levar
a cada um o Dom

Inefável da beleza,
ou, então, do âmago
das coisas recolher

O que contém de mistério
ou o banal que resume
a simplificação do mundo;

A esta hora avançada
ambos (a noite e eu)
estamos a braços com

O enigma dos enigmas.


Monday, July 29, 2013

POESIA MINIMALISTA - Hamilton Alves


Uma formiguinha
serelepe saía
de seu insuspeitado
buraquinho sob um muro
recém-caiado de branco
ao lado do qual
vingava uma pequenina
planta de muito viço;

Olhando-a, meu filho,
de cinco anos,
já poeta consumado,
perguntou-me,
deixando-me num beco
sem saída:
"Pai, quem vivou
a formiga?"

Claro, há perguntas
cujas respostas
são vãs.


Sunday, July 28, 2013

O POETA IMPOSSÍVEL - Hamilton Alves


O poeta é um cara
que come, bebe,
dorme, fornica,
e, ao contemplar-se nu,
durante o banho,
não se concebe como tal.

Até porque, segundo
ainda essa linha de pensamento,
é inconcebível ter-se como
poeta se tem duas pernas,
dois braços,
uma boca,
dentes,
uma cabeça,
duas orelhas,
toda sua precariedade física.

O poeta anda na rua,
fala com pessoas,
lê jornais,
entra e sai de prédios,
corta o cabelo,
faz as unhas,
fala horas ao telefone,
ri e angustia-se,
à noite recolhe-se ao leito -
antes, à máquina de escrever,
sempre lhe ocorre produzir
uma ou outra coisa.

Mas a só idéia de ser tido
como poeta é algo
que colide com sua pobre
contingência de ser.


Saturday, July 27, 2013

OS JOGADORES - Hamilton Alves


Três homens estão no interior de um quarto de hotel. Fumam, bebem e jogam cartas. São amigos, trabalham no mesmo ofício de venda de imóveis. Um parece ser o líder deles. Revela-se nas suas atitudes. É dele que, em geral, partem as ordens ou a orientação do que deve ou não ser feito na operação de vendas. É um homem magro, de estatura acima da média, cabelos visivelmente pintados de preto, tem um corpo já bastante estragado pela degenerescência muscular, carnes flácidas, que, quando sacode os braços, de tórax nu, percebe-se que essas carnes são frouxas. Lá fora, cai uma chuva rala. Por isso, estão ali, que é um modo de fugir ao mau tempo.
De repente o líder grita:
- Dobro a aposta.
Os outros dois o olham sem saber se aceitam o desafio ou não. Um deles é baixo, rosto redondo, cabelo carapinha, tez clara, cultivando um bigode. Tem o apelido de Pitanga. É o mais brincalhão deles. Qualquer coisa, sai-se com um chiste. O outro, o mais jovem dos três, é caladão, fixa-se às cartas, recolhe-as do monte sobre a cama, mira-as longamente, descarta outra - e assim o jogo prossegue.
Pessoas entram e saem do quarto, não se demoram muito. Falam alguma coisa, mas não se envolvem com o grupo. O jogo é a sério, valendo dinheiro, bem verdade que pouco. Não há o interesse de limpar ninguém. Jogam para se divertir.
- Manda buscar umas cervejas, Antônio. - diz o líder.
Antônio sai, desce até o bar, depois de um tempo volta em companhia do garçom. Tentou telefonar do quarto, mas a portaria não atendeu. Teve que, por isso, descer até o bar. O garçom entra no quarto enfumaçado, põe uma cerveja sobre uma mesa, os três bebem, limpam os lábios e voltam ao jogo animadamente.
- Você tem cigarro, Antônio? - pergunta-lhe Pitanga. - Me esqueci de comprar.
Antônio acende ele mesmo um cigarro e lho entrega.
- Eu disse que dobrava a parada, ninguém chiou. - disse o líder.
- Você se arrisca! - retrucou Pitanga.
A chuva despenca mais forte.
Antônio vai à janela.
- O dia tá brabo. - comenta.
- A Anita não telefonou? - pergunta o líder.
- Anita? Quem é Anita? - pergunta Pitanga.
- Você não sabe! Você está sempre por fora. Diga-lhe, Antônio, quem é Anita.
- Anita é a namorada dele, é um pedaço de mulher!
- Não façam caso dele, não é tão boa assim. Telefonou?
- Que eu saiba, não. - respondeu Antônio.
Antônio é uma espécie de pau pra toda obra. É um homem espigado, magríssimo.
Para onde o líder vai, segue-o. Carrega suas malas, dirige-lhe o carro, e, se for necessário, morre pelo líder.
- Você deixou a mulher que tinha em São Paulo? - pergunta Pitanga.
- Você sempre teve essa mania de abelhudo.
Os dois, Pitanga e o líder, brigam muito, até mesmo no jogo, mas se querem como irmãos.
- Não se deixa uma paixão velha por uma paixão nova.
- Vem você com essa filosofia barata!...
- Você já esqueceu Guiomar?
- Não fale nela... não fale...
O jogo continua. O líder fuma desbragadamente. Fuma e bebe. Antônio já pediu ao bar que mandassem mais cervejas.
A linha com o bar se normalizou a certa altura. Lá fora despenca um forte temporal.
- Uma trinca de reis e dois ases. - diz Pitanga.
- Você está com sorte. - fala por fim o mais jovem.
Súbito, desloca-se até um canto, entra no banheiro e fica lá por um tempo.
- Foi dar sua cheiradinha. - completa Pitanga.
- Que é que você tem com isso? Deixa o rapaz cafungar. O que é que tem?
- Me dá um cigarro. Pitanga diz dirigindo-se de novo a Antônio.
- Outra rodada? - pergunta o líder.
- Estou exausto. Tomei um fogo na última noite que hoje não me agüento. Será que esse cara vai demorar muito?
- Deixa-o em paz. - diz o líder.
O outro entra, os olhos congestionados, olha o grupo de uma forma estranha como se não se desse conta de nada, alheio a tudo.
- Outra rodada? - repete o líder.
- Isso me enjoa. - diz o rapaz.
- O que é que há para fazer de melhor? - diz Pitanga.
- Mulher, cara. Mulher. Preciso de uma mulher.
- Onde é que você vai arrumar uma mulher agora?
- Tem Karla, que conheci na boate, se lembra?
- Ela não viajou?
- Não. Ficou de me ligar. Mas até agora...
- Vamos à outra rodada, depois saímos para outro lugar qualquer.
Os três voltam a formar em torno da cama. Pitanga embaralha as cartas. Depois distribui cinco para cada um.
O líder pega as suas, olha-as interessado.
A certa hora o telefone tilinta. Antônio o atende.
- É pra você, Leandro.
- Quem é?
- É voz de mulher.
- Então é ela.
Ergue-se. Deixa as cartas em cima da cama. Os dois param para ouvi-lo.
- É você, meu bem? Estava esperando que você me ligasse. Onde você está? Ah, sim, te encontro à noite, vamos pegar um filme. Está bem? Até lá.
Volta ao grupo. Pega as cartas.
Há uma nuvem compacta no ar. Os três fumam, menos Antônio, que fica por ali só coringando o jogo.
- Quem foi que deu as cartas? - pergunta o líder.
- Foi Leandro.
- Que mão de anta!
- Vou ver Karla. Esta é a última rodada. Tenho que ir ao barbeiro, fazer uma barba, aparar o cabelo, dar um jeito nas fuças.
- Terminam o jogo. O líder encosta o corpo encarquilhado contra um travesseiro.
- Põe-se a refletir.
- Chove muito?
- Muito. - diz Antônio.
O líder levanta-se, vai até a janela e vê a chuva encorpar-se.


Friday, July 26, 2013

O HOMEM ARANHA II: Trazido das páginas do Gibi, a história em quadrinhos famosa passa a ser um clássico do cinema. – por Hamilton Alves


            Fui, como todo o garoto de minha geração, um fanático por HQ (Histórias em Quadrinho). Há, hoje, como sabido, no mundo todo, jovens e velhos (estes passando a barreira notável dos oitenta anos) que ainda se dedicam com interesse quase psicótico por qualquer coisa que diga respeito à HQ e são capazes de empregar uma nota preta na aquisição de um álbum do Fantasma Voador, do Mandrake ou do Príncipe Namor (também conhecido por Príncipe Submarino), tal o fascínio que esses personagens exercem sobre tais pessoas.
            Colecionei até certa idade, se me lembro bem, gibis de todos os tipos e tamanhos. Hoje, se os tivesse comigo ou conservado, teria um acervo avaliado em alguns milhares de reais, porque ainda tem doido de sobra, como disse, que é capaz de pagar boa grana por um simples gibi, que, em meu tempo, na banca do Beck, na Praça Quinze, custava 0,50 centavos. Minha querida avó tirava esse dinheirinho ganho com tanto sacrifício de suas economias para satisfazer o desejo incontido de seu neto à compra de um exemplar de Gibi semanal com as histórias inesquecíveis de Bronco Piler e Castor, Polícia Montada, Doutor Kildare, Zorro e seu amigo Tonto e tantas outras que enriqueceram a minha infância de fantasia. Afora, “O Globo Juvenil Mensal”, “O Guri” e outras edições do gênero, que eram também igualmente objeto de meu fascínio.
            Até um certo tempo, lembro-me que meus gibis formavam pilhas. Havia então o troca-troca, que, em certos casos, provocou muita briga entre os aficionados. Furtos eram incontáveis. Cada qual procurando se apropriar dos gibis alheios. E eu não era exceção à regra.
            “O Homem Aranha” estava inscrito na galeria dos heróis do “Gibi” já àquela época. Figuravam, entre os mais apreciados, Super-Homem, Fantasma Voador, Tocha Humana, etc. Mas não chegou a ser um personagem que figurasse na minha preferência. Há coisas assim inexplicáveis. Por que não me interessei pelo “Homem Aranha”? Não exercia atração sobre mim. Via aquele sujeito, com uma farda já de si pouco simpática, a subir pregado às paredes, os arranha-céus. Voava como Marvel e o Super-Homem. Também não cheguei a me apaixonar pelo Capitão Marvel, que, a meu ver, não tinha uma cara que o recomendasse. Não chegava perto do “Super-Homem”, que imitou em quase tudo. Não dava para comparar um e outro. O “Super-Homem” era melhor em tudo e convencia mais, mesmo voando, que era uma de suas especialidades.
            Bem, o fato é que “O Homem Aranha” me passou à margem, sem maior interesse. Acho até que, para a minha geração, já apaixonada e enfeitiçada por outros heróis de maior calibre, “O Homem Aranha” (a não ser que haja aí na platéia quem queira resgatá-lo em sua fama) não chegou a empolgar. Passou-nos como um personagem secundário. Que me perdoe quem discorde.
            Mas agora, sem um plano preconcebido, fui a uma videolocadora e ali, em destaque, anunciava-se o filme “O Homem Aranha II”, dirigido por um cineasta com uma folha corrida já bem recheada de bons filmes, Sam Raimi, e com atores (Tobey Maguire no papel de Homem Aranha) não tão conhecidos, mas que, apesar disso, conseguem ter um excelente desempenho, como, de um modo geral, o elenco todo impressiona bem.
            Antes de levar o filme tive o cuidado de perguntar à locadora sobre a opinião dos que já o haviam assistido. Obtive a informação de que, de um modo geral, o filme vinha agradando a gregos e avaianos, pelo que resolvi, numa noite que convidava ao recolhimento, pois chovia a cântaros, levá-lo para ver o bicho que ia dar.
            “O Homem Aranha” – só agora o descubro (antes tarde do que nunca) – expele de seus punhos uma gosma elástica, que deve ser a mesma (ou semelhante), parodicamente, com que as aranhas comuns armam suas teias tão resistentes até a vendavais. Com tal gosma gruda-se às paredes, sobe nos prédios, faz uma rede resistente até para reduzir a velocidade de locomotivas ou para grudar qualquer coisa, entre as quais, nesse filme, o seu grande inimigo, que se arma de potentes braços mecânicos, capazes de destruir tudo. Lembra muito esse personagem o inimigo nº. 1 de Batman (O Homem Morcego), o maquiavélico Pingüim, que é perito em armar tantas ciladas para seu terrível combatente.
            E, vendo o filme, comparável aos melhores que já assisti, deu-me uma nostalgia e ao mesmo tempo um atroz arrependimento de não ter incluído, em meu tempo de ledor de Gibi, “O Homem Aranha” entre meus heróis preferidos. Nesse filme ele está soberbo. Mas sua história pessoal é triste. Não tem o direito de amar, como todo o ser humano. Sua namorada se decepciona com ele, quando, na pele de um homem comum, por ser sempre, em virtude das funções por ele exercidas, desconhecidas da namorada de ser um outro personagem ou de habitar-lhe a persona heróica de um ente com poderes especiais, um retardatário, que nem mesmo a sua estréia numa peça, em vezes seguidas, comparece, com a cadeira que lhe era destinada regulamente vazia, demonstrando sua inexplicável ausência ou seu desinteresse (assim visto por ela) de apreciar seu espetáculo.
            Mas enquanto ela se exibia na peça de teatro, já atriz famosa, “O Homem Aranha” andava grudado nos prédios e voando pela cidade na perseguição de bandidos ou de seu truculento inimigo, “Dr. Octopus”.
            Em matéria de filme de aventura vou dizer uma heresia: supera “Flash Gordon no Planeta Mongo”, pois “O Homem Aranha” me pareceu mais convincente em sua arte de andar pelos ares e de ser capaz de suportar a queda de um conjunto de metais pesadíssimos na defesa de sua namorada.
            Mas no fim, quando deve comparecer a uma Igreja para casar-se com outro, o noivo a espera em vão, porque em desabalada carreira vai em busca de seu namorado retardatário, “O Homem Aranha”, agora em carne e osso, para lhe revelar que “sem ele não pode viver”.
            A luta travada entre “O Homem Aranha” e o “Dr. Octopus”, no fim, é um grande momento, tal a ferocidade dessa luta, diria que muito mais impressionante da que Starret trava com Shane em “Os brutos também amam”.
            E eu, no fim das contas, que julgava levar para casa um filme para vencer uma noite ilhado (ou recolhido) por um aguaceiro, descobri que havia assistido a um clássico do cinema de aventuras, que se incorporará a meu acervo particular dos filmes que conseguiram produzir em mim uma lágrima. Uma lágrima reverencial a esse herói, “O Homem Aranha”, na luta sem quartel do bem contra o mal.


                
                       

            

Thursday, July 25, 2013

O POEMA - Hamilton Alves





O poema? Onde está?
Tenho-o às mãos e
ao mesmo tempo não
o tenho; foge-me

Sem que possa dominá-lo;
é um animal difícil
de ser domesticado;

Está aqui, ali,
acolá, em toda parte -
isto eu o sei bem;

Mas como fazer
para obtê-lo
e, melhor, expressá-lo?

Como o vento, sem
que se possa retê-lo,
eis que vai por toda

Parte, livre como
um pássaro; por onde
segue clama tal liberdade;

Mas ainda conto
que possa domá-lo
e exprimi-lo em toda
sua plena grandeza.

XXX
(agosto/02 - poema escrito sob o pseudônimo de Max Hops)



Wednesday, July 24, 2013

UM LIVRO DE RECEITAS MASTURBATÓRIAS DE TREVISAN: “Rita Ritinha Ritona”, com dezessete contos do “Vampiro de Curitiba”, é o seu mais novo lançamento. - por Hamilton Alves


Tenho de longa data uma pinimba com Dalton Trevisan. Não conheço sua obra toda, mas poucas (três ou quatro), não me animei a ir ao resto, se é que o fato de ter lido essas seria suficiente indicação do que eram as demais.
Conheço leitores que são entusiastas de Dalton. Na verdade, o que escreve não é só pornografia. Ou erotismo do mais deslavado.
Um desses leitores me recomendou um livro dele, “O cemitério de elefantes”, onde tem um conto que é muito referido pela crítica, “Uma vela para Dario”, que foi eleito como uma obra prima do gênero.
Dario é um personagem que cai morto na rua e, em vez de solidariedade de seus semelhantes, o que lhe vem a ocorrer é o despojamento de todos os seus pertences. Só um lembrou-se, quando exalava o último suspiro, de pôr-lhe uma vela junto ao corpo. Daí o título do conto.
O mesmo amigo, assíduo e apaixonado admirador da obra de Trevisan, há pouco, me sugeriu a aquisição de outro de seus livros, que considerou muito bom: “O grande deflorador”, (LP&M, 98 págs.), com vinte e uma histórias. Não há que duvidar: o título fala pelo conteúdo. São contos na linha habitual ou conhecida do escritor, de um picante sabor erótico.
O lançamento mais recente “Rita Ritinha Ritona” abre-se com um conto de treze páginas, sob o título “Maria, sua criada”. De que se trata? Uma adolescente, de treze anos, que vem do nordeste (área conflagrada, como sabido, pela miséria) à procura de emprego. Encontra-o numa casa em que o marido, por deveres profissionais, passa mais tempo fora do lar, e a mulher o trai sem cerimonia. A história da moça nordestina (semelhante à desdita de Dorotéa, em “A hora da estrela” de Clarice Lispector), segue até o fim conhecendo ou vivendo as mais escabrosas experiências pelas quais possa passar uma criatura, até que ela própria se vê envolvida em atos concupiscentes que jamais sonhara. Mas à parte o tema erótico (o livro é recheado de ponta a ponta por tais episódios), o conto torna-se fastidioso até porque a narrativa é de caráter tão grotesco que se sai dela meio entorpecido. E o que é pior: a linguagem é pobre, o conto mal estruturado, - e o leitor fica se perguntando a que se deve todo o prestígio que desfruta Trevisan como contista.
Há três outros contos (um dos quais beira simplesmente a obscenidade, “O mestre e a aluna”) que não mudam o tom, na mesma linha de baixezas morais ou sexuais, como se isso fosse do agrado geral do público ledor. Se há quem necessite de excitações, o livro de Trevisan é uma boa receita.
Não é apenas isso, no entanto, que há de se ressaltar nesse livro “Rita Ritinha Ritona”, mas também a qualidade literária, que, em poucos contos, alcança um bom nível, não obstante a apelação que os caracteriza.
Devemos admitir literariamente o erotismo? Por que não? Mas há erotismo e erotismo. O conto de Machado de Assis “Missa do galo” é um conto erótico, sutilmente erótico, sem parecer erótico. O jovem que vai passar a noite de natal na casa de Conceição e seu marido e que, por ela, a certa altura, é advertido de que o amigo que prometera vir ao encontro dele o chama à rua para assistirem à missa do galo, vive momentos de relacionamento que bem revelam o desejo que um sente pelo outro (ou a atração física ou libidinosa), sem, contudo, deixar transparecê-lo. O fato é mais acentuado porque Conceição sabe que o marido a trai. E o moço é uma oportunidade excelente para que se vingue da infidelidade do esposo.
Nos contos de Trevisan, porém, o adultério, a lascívia, a concupiscência são reveladas sem qualquer pudor. Não chegam, nem de longe, à extrema e rara habilidade machadiana para insinuar o que se passa, não nos atos, mas na mente de seus personagens, que mal são esboçados nos gestos ou na fala.
Mas nem sempre o erótico tem sido a marca dos contos de Trevisan, embora lhes seja o traço peculiar.
Numa antologia de contos de Natal, editada pela “Relume Dumará”, 1996, Trevisan tem um conto com o título “Onde estão os natais de antanho”, que considero não apenas uma obra prima no gênero, mas o incluo entre os melhores que já li. É, na verdade, um instante excepcional na sua carreira de contista. Não conheço outro de sua autoria que o supere.
Há outro, “A testemunha”, de igual nível, mas ainda fico com o primeiro como podendo ser referido como esse momento único que todo o escritor tem em sua trajetória.
Trevisan não dá entrevista. Houve uma tentativa apócrifa, por ele devidamente repudiada, de obter-lhe respostas a algumas perguntas que muitos de seus leitores gostariam de formular-lhe. Mas se esconde de jornalistas. Ou de entrevistadores. A justificativa é de que tudo que tem a dizer está contido na sua obra.
Mas se o conhecesse ou privasse com ele, gostaria que me revelasse porque sua preferência manifesta pelo erotismo de bas-fond.
Isso deve ter uma explicação, pelo menos a nível psicanalítico.
“Rita Ritinha Ritona” – para voltar mais uma vez a esse último lançamento – é de uma escabrosidade que não conhece barreiras. O conto já referido “O mestre e a aluna” é uma série infindável de situações das mais degradantes concebíveis, em que todas as experiências da libido são descritas com a mais intensa e fria crueza. Trata-se de um professor que pretende analisar o trabalho de uma aluna sobre a personagem machadiana Capitu. É conhecida a posição de Trevisan quanto ao caso Bentinho, Capitu, Escobar, de acordo com a qual Capitu traiu inapelavelmente o marido com Escobar. A maior prova disso, segundo a teoria de Trevisan e a de quem lhe segue a opinião, é que Ezequiel, suposto filho do casal, é a cara de Escobar.
Em vez de sabatinada sobre o tema, a jovem e esbelta aluna é levada às mais diabólicas práticas sexuais com o mestre.
O livro não choca apenas por isso (o que não seria de menos), mas é que, no conjunto, deixa muito a desejar e segue por uma mesmice e lugares comuns que enchem de tédio o mais tolerante leitor. Cito, como modelo, um conto de duas páginas, sob o título “Em família”. Não há nada mais desinteressante, de baixo nível, de má estrutura literária do que esse conto.
Não vou perder tempo em resumi-lo.
Não duvido que Trevisan seja um bom escritor (tem coisas ótimas em sua já volumosa obra), mas “Rita Ritinha Ritona” é revelador, antes de tudo, de que, no mínimo, ele precisa se recauchutar para nova empreitada literária.



 

Tuesday, July 23, 2013

AURORA - Hamilton Alves



O galo é um despertador
mavioso que atua
à margem da vida;

Quanto mais seu canto
evola no ar
mais desperto
torno-me eu;

Nem se fale que se
trata apenas do natural
despertar do sono,

Mas de outro tipo:
que tem a ver
com outra aurora,

Esta que parece
inaugurar em nós
um novo ser.


Monday, July 22, 2013

POEMA DA DUPLICIDADE - Hamilton Alves


É uma rua
com duas quadras
dois jardins
dois pássaros
dois guardas
duas mulheres
com dois montículos
de nuvens no céu
com dois gatos
com dois bares
com dois cegos
que a atravessam
guiados por uma bengala
dois bêbados
duas janelas
duas portas
enquanto curto
duas dúvidas e
duas tristezas
É preciso colocar
dois caminhos
um por onde vá
outro por onde volte.
e isto é tudo.


Sunday, July 21, 2013

O BÊBADO AZUL DO DESTERRO: livro de Ilmar Carvalho, misto de crônicas e contos, concretiza o sonho do escritor/melômano de ver-se, finalmente, editado. - por Hamilton Alves

           

            Depois de trilhar uma longa caminhada no jornalismo (exerceu-o desde a adolescência), como cronista, contista e crítico musical, na condição do que pontifica com artigos no Jornal do Comércio, do Rio, Ilmar Carvalho vê, por fim, realizado o grande sonho de editar um livro, “O Bêbado Azul do Desterro”, que, como ele me disse há pouco, num papo telefônico, reúne suas melhores crônicas e os poucos contos que escreveu durante seus quase oitenta anos. O forte de sua produção literária são seus artigos sobre música, desde a popular até a erudita, no que se tornou um dos poucos especialistas. Agora mesmo brindou esta folha com um trabalho sobre o violoncelista Antonio Meneses, que, além de outras execuções famosas, vem de gravar as seis suítes de Bach, no que foi tão bem sucedido (segundo Ilmar) quanto Pablo Casals, o maior violoncelista conhecido até hoje no mundo e reconhecidamente o que conseguiu a melhor execução da obra referida.
            Poucos cronistas têm ou escreveram uma crônica referencial. Ou aquela que todo mundo cita porque de alguma forma entrou até no folclore popular. Apesar de não ser muito prolífero na qualidade de cronista, perpetrou uma sobre a qual, em conversas literárias, vem sempre à baila: “Da vantagem de ser jovem no Estreito”, que foi um marco na obra de Ilmar. A outra não precisa nem mencionar, pertence a Rubem Braga, “Eu e bebú na hora neutra da madrugada”, que, igual à de Ilmar, todo mundo conhece, cita e é capaz de conhecer trechos de cor, como foi o meu caso, há algum tempo, quando os dizia para amigos.
O volume, que deverá ser lançado no próximo dia 21, em Joinville (terra natal de Ilmar e onde viveu, como não poderia deixar de ser, os momentos culminantes ou marcantes de sua existência quase octogenária), tem oitenta páginas e foi editado pela editora “Letradágua”, de Joinville. Quem a dirige é Joel Gehlen, que não faz muito editou o “Anexo”, encarte cultural do jornal “A Notícia”, que teve, com ele, sem dúvida, seu melhor período. Amigo de Ilmar, quando soube que este reunia as crônicas e contos para uma futura publicação, propôs-se a fazê-lo, com o que Ilmar concordou. Mas até que a obra fosse concluída decorreram alguns anos. Nos contatos com Ilmar lhe cobrava a edição de seu livro. Vinha com a mesma lenga-lenga de que tinha entregado os originais para o Gehlen e o ‘Alemão’ (apelido de Gehlen) não dera ainda o ar de sua graça, de tal modo que nem mesmo ele saberia dizer quando se dariam por editados.
Soube de amigos íntimos de Ilmar sua pouca ligação com projetos de divulgação do que faz. A editora da UFSC, em certo período, colocou-se à disposição para editar o livro que ora será lançado. Ou até o que havia escrito em jornais sobre música. Tem uma vastíssima produção sobre esse tema. E das mais preciosas, como o reconhecem pessoas que privam de sua amizade, inclusive Salim Miguel, que conhece mais de perto o problema do Ilmar de editar ou não ser editado, de tomar ou não a iniciativa para a levar a bom termo a publicação do que escreve. Não obstante receber aprovação, por antecipação, da edição desse material, Ilmar nunca o enviou à editora da UFSC. Por quê? Ninguém sabe. É de seu temperamento. É um escritor que produz com até relativa facilidade. Mas é complicado chegar ao livro impresso. Há quem tenha um convívio mais próximo de Ilmar (como é o caso citado de Salim Miguel, que com ele conviveu no Rio durante a temporada em que lá morou) e o que comenta, entre amigos, é essa inclinação do Ilmar, não muito bem explicada, para não comer o bolo quando lhe foi dado de mão beijada.
O primeiro a receber (também o prefaciou) “O Bêbado Azul do Desterro” foi seu velho amigo Salim. Em seguida, mandou-lhe o recado de que as crônicas e os contos lhe tinham impressionado favoravelmente. Não era a crítica do amigo, mas o comentário do crítico.
Dos trabalhos editados, conheço apenas dois, o já mencionado “Da vantagem de ser jovem no Estreito”, que é inegavelmente uma página e meia antológica, e outro, publicado no “Anexo”, de também duas páginas, que tenho guardado em arquivo, que já quis publicar com sua antologia de contos, com a autorização prévia do Ilmar (consultado antes de qualquer outro dos integrantes dessa eventual antologia), “Joinville dos 40”, que se refere a reminiscências do escritor da época de ouro em que viveu em Joinville, ali cresceu e conheceu as primeiras experiências da vida.
Falei com ele há dias sobre o livro. Brincalhonamente, disse-lhe:
- Até que por fim o pariste?
- Vou lançá-lo em Joinville, mas farei, sem data ainda marcada, lançamentos em Florianópolis e Rio.
- Quantos exemplares são?
- Mil.
Deu-me detalhes gráficos do livro. A ilustração de capa foi feita por Luis Gustavo Meneghin. Ilmar considerou-a muito boa. A capa é em branco com a ilustração em azul tomando 2/3 dela. Fez-me lembrar a primeira edição de Ulisses, de Joyce, que tinha as mesmas cores (referência de Sylvia Beach, em seu livro, há pouco editado pela “Casa da Palavra”, “Shakespeare & Companhia – uma livraria na Paris do entreguerras”).
Houve um momento que Ilmar mostrou-se desanimado quanto às possibilidades de edição do livro. O Alemão não lhe dava notícias da edição. Passou um bom tempo sem a menor informação do andamento ou a fase em que se encontrava. Até que há pouco o surpreendeu com a notícia de que a fase final estava concluída, recebendo quatro exemplares, um dos quais presenteou ao Salim, o que foi facilitado pela presença desse escritor no Rio, onde foi participar da Bienal do Livro e para outros fins.
Cobrei o meu.
- O teu tens que esperar um pouco, pois os quatro que o Alemão me mandou sumiram. Só fiquei com um.
Não é preciso dizer que, ainda que não possua o livro, nem possa por isso ainda julgá-lo, “O Bêbado Azul do Desterro”, título de uma das crônicas, vem chancelado com a reconhecida qualidade do texto de Ilmar. Tanto na sua obra literária quanto na crítica musical, a marca do Ilmar é a do esmerado tratamento de seu trabalho (ainda agora tivemos oportunidade de verificar isso no artigo sobre Antonio Meneses, que é rigorosamente bem realizado).
O título do livro dispensa comentário e revela também seu bom gosto.
A estréia de Ilmar (e ele o faz um pouco tarde, quando, como dito, vai beirando a casa dos oitenta) deve ser, por tudo isso, muito bem acolhida e acredito no êxito antecipado do lançamento do livro nas praças referidas (Joinville, Florianópolis e Rio), onde, não fosse pelo bom nível das crônicas e contos, já conhecidas algumas delas, seria pelo fato de que tem uma legião de amigos, que certamente vão prestigiá-lo em todos esses eventos (palavra que, diga-se “en passant”, ele detesta).
  

Saturday, July 20, 2013

BREVE (E TRÁGICA) HISTÓRIA DE OSCAR - Hamilton Alves


Creio que todo mundo em minha ruidosa época de moço conheceu Oscar. Quem poderá dizer, sendo da minha geração, que não o conheceu? Ou que não teve oportunidade, por menor que fosse, de conviver alguns instantes com ele? Ou de sentir-lhe o humor, a sensibilidade, a profundidade que tinham suas palavras às vezes ditas a esmo?
Na verdade, não me proporei, como o título pretensioso diz, a narrar a história de Oscar, caso contrário isto não seria um conto com algumas poucas páginas, mas uma novela ou quem sabe até um alentado romance. A vida de Oscar foi tão cheia, tão repleta de acontecimentos e sobre ele inventaram-se, verdadeiros ou não, tantos fatos e ocorrências, típicas de sua curiosa personalidade, que daria um romance. Todas as vidas, afinal, bem contadas, dão ( ou dariam) um romance.
Limito-me a identificá-lo com o prenome, a medo de que o nome patronímico o revele ao leitor. Oscar, certamente, não gostaria que trouxesse pormenores de sua existência para estas páginas.
Oscar era, digamos logo, um "primus inter pares". Talvez, de todas as pessoas que nesse largo período de vida que me foi dado conhecer, não tenha outra igual, com seu temperamento, com seu chiste, sua verve, seu talento, sua independência, sua vocação para uma vida, não digo dissoluta (isto seria exagerar nas tintas), mas para a anarquia, no seu sentido mais lato.
Oscar nunca ambicionou nada.
Dinheiro e honrarias, para ele, não contavam para nada. Quanto à aparência, estava longe de se incomodar com ela. Parece-me que sempre usou o mesmo terno a vida toda. Seus sapatos eram de tal maneira sem brilho, opacos, que nunca chamavam a atenção.
A maneira de rir (e ria muito em qualquer situação que se lhe apresentasse, até porque sempre tive a desconfiança que todas as situações com que se defrontava, fossem quais fossem, lhe pareciam cômicas) de Oscar era um dado à parte em sua pessoa. Ria fininho (e há quem possa pensar que um tal riso traz uma forma de deboche), mas o riso de Oscar era franco, infantil, expressão de sua pura alegria.
Quando ele segurava um pileque, nos botecos sórdidos, dava para cantar em francês belas cançonetas, de cuja língua foi professor num colégio durante algum tempo - e dele saiu porque seu comportamento foi considerado meio marginal pela direção da dita  escola - que inventava ou criava na hora.
Uma vez, quando vivia um problema sério de sobrevivência, apresentou-se numa estação de rádio para produzir um programa. O diretor da emissora levou uma entrevista meio longa com ele.
- O senhor é produtor de programas?
- Sim, tenho experiência em produzi-los.
- Em que emissora já trabalhou?
Oscar citou umas duas ou três.
- Vamos fazer um teste. - disse-lhe o tal diretor.
E acrescentou em seguida:         
- O senhor tem aí máquina de escrever e papel para produzir um programa sobre tema que quiser. Terá ainda o tempo que entender.
E, para terminar, disse-lhe:
- Boa sorte.
Oscar encafuou-se num recinto pequeno, que era onde os redatores trabalhavam no noticiário, e ali ficou por bem uma hora ou mais, produzindo seu programa radiofônico.
Entregou seis ou oito laudas datilografadas ao diretor. Este olhou-as, leu-as e, a certa hora, fez-lhe a seguinte observação:
- De um modo geral, seu programa está satisfatório. Mas há um reparo a fazer.
- Reparo?!... - Oscar arregalou os olhos, revelando-se preocupado.
- Sim, um pequeno pormenor.
- De que se trata?
- O senhor tem frases que se iniciam com pronome oblíquo. E isso é um erro palmar de gramática. - disse o diretor.
Oscar olhou-o ensimesmado e entendeu que não tinha condições de trabalhar na tal emissora, se o diretor considerava tanto assim a colocação pronominal. Mas resolveu comentar:
- Nas emissoras em que trabalhei nunca me foi exigido colocar pronomes nos lugares certos.
Pelo que o diretor, do alto de sua prosopopéia, disse:
- Aqui, porém, é diferente; fazemos questão dos pronomes nos lugares.
Oscar silenciou. Olhou à esquerda, à direita, e percebeu em volta um grande silêncio conivente à crítica do diretor. E mais uma vez na vida sentiu que o chão lhe faltava e que ali não tinha a mínima condição de garantir o pirão de cada dia, pelo que, logo em seguida, bateu em retirada.
Oscar foi trabalhar, tempos depois, noutra emissora, em que nada se lhe exigiu, nem testes, nem pronomes bem colocados, nem nada.
Mas tudo foi uma curta lua de mel porque bebia mais do que escrevia.
Para tornar breve esta história, foi tal a maneira desbragada que Oscar passou, de certa época em diante, a viver - e ele revelava especial gozo em fazê-lo - que, certa noite, foi surpreendido, feito menino, (pois jamais distinguiu ou separou o homem adulto da criança) a pular os muros de uma praça, aos xingamentos dos motoristas de taxis que faziam ponto em volta, chamando-o ininterruptamente, em uníssono:
- Corno, corno, corno!
Quanto mais era assim alvo da maledicência de tais pessoas, mais Oscar assanhava-se em pular os bancos da dita praça, como se loucamente quisesse escapar a esse vozerio pleno de uma grave acusação a sua honra de jornalista, de produtor de programas de rádio, de professor de francês, de poeta.
Passou um tempo sem que aparecesse nas rodas costumeiras.
Por onde andaria?
Todos que o conheciam e tiveram o privilégio de conviver com ele faziam esta pergunta.
Dizia-se que fora certa feita desrespeitado por um aluno num bar, mas um amigo lhe tomara a defesa. Em geral, Oscar não revidava aos ataques dos desafetos. Era de natureza tão frágil que não reagia a qualquer tipo de agressão. Não que fosse covarde; era bastante tímido.
O amigo disse a tal aluno:
- Você o desrespeita porque ele é generoso e bom professor. Certamente, não o reprovará mesmo que você o mereça e, em geral, a uma pessoa assim não se leva muito em consideração.
O aluno, a estas palavras, recolheu-se ao mais completo mutismo.
A última notícia que ecoou sobre Oscar foi que tinha se submetido a uma cirurgia de risco.
Numa tarde de vento sul e chuva, soube-se que não resistira à operação e morrera.
Há quem diga que, depois disso, um vulto, nas madrugadas silenciosas e tristes da praça, onde sofrera uma chusma de ditos escabrosos, partidos dos taxistas, em idos tempos passados, atravessa-a de um lado a outro, pulando os bancos como um menino.