Quando
adolescente, nunca fui dado a abordar moças. Cheguei à puberdade sem dominar a
arte de envolvimento do sexo feminino. Tive tentativas malogradas. Sofri desde
cedo o problema da rejeição das meninas pelas quais tomava-me de paixão. O primeiro
amor, por exemplo, foi um fracasso e alguns outros também. Não era dotado de
beleza física. Esta qualidade prepondera para a escolha de parceiros ou
namorados que as moças fazem. Mas também houve casos, poucos, em que a rejeição
partiu de mim. Algumas delas eram até moças bonitas.
Nas lembranças de minhas aventuras e
desventuras amorosas há um episódio que me marcou por toda a vida. Não era
sócio de clubes e, por isso, só de quando em quando, com a ajuda de outros
amigos, conseguia frequentá-los. Foi assim numa noite de uma “soirée” num clube
local, levado por um velho amigo, que conversou o porteiro e ambos conseguimos
ingresso.
Meu amigo era mais voltado ao bar,
onde rapidamente se embebedava com a ingestão de cuba-libres, do que
propriamente a dançar. Eu também não era ainda perito em dança. Estava dando
meus primeiros passos muito a medo. Encostado à parede, ficava observando os
pares saindo ao salão. Meu medo era invencível de não saber dançar, de não
encontrar uma parceira com paciência de me ensinar os passos.
Quando todos haviam saído para o
espaço de dança, quando só uma moçoila sobrava a uma mesa, triste, como se
sofresse o problema de não ter recebido um convite para dançar, disse de mim
para mim:
-
Eis aí uma oportunidade que não devo perder.
Tratava-se
de uma menina feinha, baixinha, magrela, metida num vestidinho azul. Morena, de
cabelos encaracolados. Havia a dificuldade de sua mesa se localizar do outro
lado do salão. Teria que atravessá-lo de lado a lado, à vista de todos, para
propor-lhe a dança. E isso equivaleria, para mim, uma espécie de travessia do
“Rubicão”.
Mas
enchi-me de ânimo e dei a partida. Naquele momento em que me encorajava a essa
suprema aventura, me sentia o alvo de todos. Já meio caminho, senti um calafrio
dominar-me dos pés à cabeça.
-
Agora não há como voltar.
Segui
impávido, desse no que desse.
Quando
me aproximava das cercanias onde a moça estava instalada, olhou-me com um olhar
frio, como se dissesse consigo mesma:
-
Lá vem um chato.
Percebi
seu olhar gélido e tive ímpetos de mudar de direção, simulando que ia a outro
qualquer lugar e não a sua mesa.
Mas
alguma coisa, mais forte do que eu fez-me prosseguir e avançar. Não estava só;
havia mais outra moçoila à mesa, mais magra e mais feia do que ela.
Quando
parti para tirá-la, considerei a circunstância de que só ela não merecera de
ninguém o convite para dançar. Deduzi que, por isso mesmo, meu empreendimento
estaria a salvo de qualquer fracasso. Se ninguém saíra para dançar com ela era
sinal evidente de que não era tão requisitada, que era, na minha visão, um
refugo. E, como tal, era bem o que para um dançarino neófito servia.
Já
diante dela, arrostando a sua fisionomia onde se desenhava uma expressão pouco
simpática e acolhedora, disse:
-
Vamos dançar?
A
princípio, ela me olhou bem nos olhos como se me analisasse a alma, como se
primeiro julgasse se eu a merecia. A seguir, notei que ela olhou para a
companheira de mesa e deu um risinho mofento.
Enquanto
isso acontecia, eu ficara feito uma esfinge silenciosa diante dela.
Fez
uma cara de poucos amigos, franziu a boca num muxoxo e proferiu a sentença
acachapante:
-
Não, não posso.
Fiquei
paralisado, sem saber que rumo tomar, se voltava sobre meus próprios pés, se
permanecia feito idiota diante dela ou se seguia outro qualquer caminho. Fiquei
assim indeciso por alguns momentos. Atrás de mim, ouvi espoucarem risos.
Como
não havia outro jeito e desde que senti que já podia despregar os pés do chão,
com força suficiente para me mover, enfiei em direção à porta de saída do clube,
desci três ou quatro lances de escada com a celeridade de um raio e, quando me
vi lá fora, por fim livre do vexame, tomei fôlego e saí feito louco pelas
ruas.
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