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Tuesday, January 10, 2017

OS GRANDES DIRETORES DE CINEMA (Organizado por Laurent Tirard, o livro, que ora circula nas livrarias, tem vinte nomes de cineastas para explicar como se faz cinema) *(por Hamilton Alves)


            Falou-se em cinema é comigo mesmo. Não tenho a paixão de um Darci Costa, que sabe tudo sobre a sétima arte, mas como outros críticos iguais afastou-se das salas ou dos vídeos caseiros porque entende que o cinema baixou de qualidade. Hoje, impera o lixo, com algumas raras exceções.
            Na verdade, não é só o cinema que passa por uma grande crise de qualidade, mas tudo em geral, a literatura, a música, a pintura, etc.
            Esse livro a que me refiro, “Os grandes diretores de cinema”, enfileira vinte nomes alguns dos quais não pontificam entre os mais badalados ou mais consagrados. Tem alguns expoentes. Bernardo Bertolucci, Martin Scorsese, Almodóvar, Win Wenders, Sydney Pollack, Lars Von Trier, Jean-Luc Godard e Woody Allen são os destaques entre os restantes.
            A contracapa traz uma frase (ou pensamento) de alguns desses diretores sobre direção. Mas a meu ver Jean-Luc Godard matou a cobra e mostrou o pau (epa!).
            Diz ele: “Você quer fazer cinema? Pegue uma câmera”.
            Quase empatou com a linha de pensamento de Glauber Rocha, ou seja, “uma máquina na mão e uma idéia na cabeça”, que Anselmo Duarte traduziu, ironicamente, para “uma máquina na mão e merda na cabeça”, referindo-se especificamente ao cinema feito por Glauber.
            Nenhuma das definições dos cineastas que esboçaram a linha de ação no cinema que fazem disse coisa mais acertada, numa síntese que explica tudo. Já não convence muito o que diz, por exemplo, Woody Allen (para ficarmos só no que vem dito na contracapa do livro): “Quando chego ao set, não sei de nada”. Isso, no mínimo, não passa de “boutade”. Um diretor, quando chega ao set, sabe de tudo ou pelo menos deve saber. Ou será verdadeiro que ele improvisa tudo? Já Scorcese explica: “Tudo se resume a uma pergunta: você tem algo a dizer?”.
            Bem, um diretor pode não ter nada a dizer e nem por isso deixar de fazer um bom filme. Um filme não depende de dizer alguma coisa. Os melhores filmes, nos últimos tempos, são os que não dizem nada, na linha de Godard ou Alain Resnais, que em vários momentos exercitaram essa função de não dizer nada dizendo tudo ou o necessário.
            Já Win Wenders me pareceu simplório ou não tão arguto, quando afirmou: “O dever do diretor é ter o desejo de contar”. Não vai ao fundo da questão.
            Outro que bateu com a bola na trave foi David Lynch, quando asseverou: “Um diretor deve pensar ao mesmo tempo com o cérebro e o coração”. Bobagem.
            Takeshi Kitano (para mim um ilustre desconhecido) repetiu quase essa mesma tolice: “Um filme é uma caixa de brinquedos”.
            Bernardo Bertolucci não teve reproduzido seu pensamento na contracapa, mas o texto que escreveu vale o livro.
            Uma vez estava num espaço aberto. Súbito, uma câmera projetou um grupo de pessoas numa tela. A câmera deu um largo passeio pelo local, até que me flagrou num papo animado. Comentei para um amigo: “Cinema é isso”. Coincidente com a opinião de Godard de que, para fazer cinema, basta uma câmera na mão, tirante a idéia de Glauber de ter uma idéia na cabeça. Nem precisa de idéia porque, em última análise, cinema é imagem. Se seguirmos o princípio do “ready-made” duchampiano, cinema não passa de projeção de imagens. História (ou idéia) para que? Os melhores filmes que vi não tinham história. Mário Peixoto, com “Limite”, seguiu esse modelo. “Limite” é cinema puro. Ou pura imagem.
            Há um negócio chamado roteiro.
Houve grandes roteiristas.
O roteirista de “De olhos bem fechados”, de Kubrick, brigou com este porque não seguiu o roteiro. Li o livro em que conta pormenorizadamente essa história.
Não chegou jamais a entender (ou pelo menos não o revelou nesse livro) que o roteiro e o cinema são duas linguagens, uma é literária, a outra não tem nada a ver com literatura. Quanto mais o cinema se afasta da literatura tanto mais se torna cinema. Kubrick fugiu ao roteiro. Ou não o seguiu. Evidentemente, tratando-se de duas linguagens, uma é independente em relação à outra. O roteirista não quis aceitar isso. Brigou com Kubrick. Houve estremecimentos recíprocos.
No caso de “Casablanca”, no fim, o roteiro teve que se dobrar à conveniência do desfecho. O dilema foi saber com quem ficaria Ilse (Ingrid Bergman): com Bogart ou Paul Henreid? O roteiro tem que ceder às conveniências do diretor. Ou nunca se fará um bom filme. O melhor é o filme que não tem roteiro nenhum, como penso seja o caso de Godard: só trabalha com a imagem e, vez que outra, segue algum encadeamento.
Os diretores são diferentes entre si, assim como, em outra arte qualquer, um artista é diferente de outro. Cada qual tem uma linguagem própria.
Seria o caso de mencionar Chaplin, Fellini, que faziam o roteiro de suas fitas, Orson Welles, com Cidadão Kane, que mudou os rumos do cinema (segundo opinam alguns críticos), John Ford (com “No tempo das diligências”, que Welles assistiu dez vezes para aprender técnica de cinema), Hitchcock e tantos outros.
Woody Allen acha que um diretor nasce feito. Direção não se aprende em escola. Pode ser esta uma idéia falsa. Fellini aprendeu direção com Rossellini. Nunca fez segredo disso.
Para os amantes da sétima arte “Os grandes Diretores de Cinema” é um prato cheio, embora seja falto de alguns renomados diretores, que bem poderiam constar da lista.
Não digo que seja uma leitura obrigatória para quem quer tomar umas aulas de direção, mas vale a pena percorrer-se as 250 páginas, na edição da “Nova Fronteira”.
Confesso que fui levado a adquirir o livro por causa de dois grandes cineastas, Godard e Bertolucci. Os outros não fazem tanto a minha cabeça.
Vi alguns bons filmes de ambos.
Considero “O último tango em Paris”, com Marlon Brando e Maria Schneider, um momento apoteótico do cinema. A cena de Brando dançando com Schneider num salão em que se realizava um concurso de que participavam dançarinos de tango, em que Brando exibe   as nádegas para os presentes, é uma das mais antológicas do cinema de todos os tempos. Vou provocar muxoxos entre alguns leitores. Que fazer?
Godard nos deu “Alphaville” e “O demônio das onze horas” (ou Pierrot, le Fou), duas obras primas.
Quem tiver ambição de ser diretor, está aí um livro que pode ser o primeiro passo para seguir-se tal carreira.


             

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