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Friday, December 9, 2016

GRAHAM GREENE NÃO LEVOU O NOBEL (um dos melhores escritores de seu tempo, a Academia da Suécia, injustificadamente, lhe negou o maior laurel literário) (por Hamilton Alves)



            Um dos mais fervorosos simpatizantes da literatura de Graham Greene, que certamente estão espalhados, ainda agora, pelo mundo todo, foi o escritor Holdemar de Menezes, que muitas vezes lhe fez referência a amigos em particular. Não foi nem uma nem duas vezes que o ouvi (nesse tempo ainda não tinha nenhuma intimidade com Holdemar) referindo-se elogiosamente a Greene. Outros de seus admiradores é um escritor e ensaísta pernambucano, com quem, por acaso, fiz amizade faz uns tempos, Fernando Monteiro, que há pouco me recomendou um livro do autor inglês, “O homem de muitos nomes”, que considera uma obra prima.
            - Um dia, dizia-me Monteiro numa troca de cartas, se reconhecerá a grandeza de Greene.
            Devo adiantar que não sou doutor em Greene. Falta-me muito ainda para sê-lo. Ou para estar à altura dos conhecimentos que Holdemar tinha e que Monteiro tem sobre o escritor. Li alguns poucos livros dele. E talvez o maior de todos, que é sua obra prima consumada e assim reconhecida pela crítica, é referente ao padre perseguido pela polícia mexicana, que traz o título de “O poder e a glória”, que adquiri num restaurante de beira-de-estrada , em Registro, numa viagem a São Paulo. Havia numa estante muitos livros e, dentre todos, este me aguçou especialmente a curiosidade.
            Eis algumas obras de Greene: “Fim de caso”, que virou fita de cinema e das melhores, que narra a história de um trio amoroso, em que Henry trái seu melhor amigo com a mulher deste; “Expresso do Oriente”, que é uma bela narrativa, envolvendo uma aventura de vários personagens numa viagem através da Europa de trem. Há nesse livro um momento em que, para o personagem Savory, é feita a seguinte pergunta:
            - Qual sua opinião sobre a literatura moderna, Joyce, Lawrence, tudo isso?
            - Passará – disse o Sr. Savory, prontamente, com o efeito de um epigrama.
            Na opinião de Greene a literatura moderna tenderia também a passar e autores como os citados não resistiriam a erosão do tempo?
            Bem, Joyce e Lawrence estão ainda vivos e bem vivos, resistindo a todos os solavancos das mudanças de nosso tempo para melhor ou pior.
            Outro romance de Greene, “O americano tranquilo”, não tem o mesmo peso dos dois precedentes, embora seja uma história, para os admiradores de Greene, de bom teor literário.
            Perdi esse livro em tantas mudanças que fiz no curso da minha vida, como por igual razão outras obras primas se extraviaram. Nunca mais pus os olhos nelas. Entre essas estava a novela referida. Andei a sua cata, até porque um resenhista de jornal fez um trabalho excelente em cima dela. Finalmente, encontrei-a em um sebo. Isso me causou uma grande alegria (a recuperação de um livro muito estimado sempre é um motivo de euforia para ledores) e voltei a lê-lo com o mesmo prazer da primeira vez.
            Um livro um pouco (ou bastante) fora da linha de clássicos do autor é “Dr. Fischer de Genebra ou a festa da bomba”, muito ruim.
            Numa livraria de uma cidadezinha do interior encontrei “Monsenhor Quixote”, que me possibilitou algum deleite. Esse Monsenhor tem algo de D. Quixote, de Cervantes, daí sua alcunha. Também achei meio fraco “O terceiro homem”, que Orson Wells levou ao cinema, com ele e Joseph Cotten, dando um bom filme. E de Greene foi só.
            Quanto à vida pessoal de Greene, foi um homem que viajou pelos quatro cantos do planeta. Todo mundo sabe, ou ao menos quem lida com literatura, que Greene, quando moço, tentou matar-se. Converteu-se ao catolicismo e, talvez, por isso, tenha escapado de dar fim à própria vida. Era um mulherengo incorrigível.
            Há quem diga que “Fim de caso” é nada mais que uma história vivida por ele mesmo e que o personagem Henry é seu alter-ego. Mas Greene, que eu saiba, nunca se referiu a isso. Ou nunca lhe foi perguntado.
            Foi jornalista ou correspondente de jornais londrinos durante grande parte de sua existência. Com essa experiência jornalística, adquiriu os instrumentos necessários para se lançar como novelista. Greene foi também crítico de cinema. Viajando para o México como repórter, colheu o tema para escrever “O poder e a glória”, que, na contra capa, da minha edição, lê-se o seguinte comentário: “Durante um expurgo anticlerical num dos estados meridionais do México, ele é caçado como uma lebre. Humano demais para ser um herói, humilde demais para ser um mártir, o pequeno e mundano “padre beberrão” é, no entanto, impelido em direção ao seu esquálido calvário tanto por sua compaixão pela humanidade quanto pelos esforços de seus perseguidores. Um abutre maléfico paira sobre esta moderna história de crucificação, mas acima do abutre voa uma águia – a inevitabilidade do triunfo da igreja”.
            Greene pertenceu ao serviço secreto inglês, o Foreign Office, durante certo tempo. Esteve, nessa condição, na Serra Leoa, onde colheu dois temas para novas histórias (O Ministério do medo e o Centro da Questão). Seus resenhistas dizem que, em sua obra, Greene buscou como uma paixão as sendas misteriosas do pecado, do demônio e do inferno e das graças do amor cristão.
            Esperou sempre pelo Nobel, embora haja quem diga que isso nunca esteve nas suas cogitações.
            Outros escritores, com menor bagagem ou até com menor importância, abiscoitaram o cobiçado prêmio. A Academia da Suécia tem critérios estranhos. As três eminências pardas da literatura, Joyce, Kafka e Proust também não foram lembrados. Proust talvez não pudesse recebê-lo pelo fato de, a sua época, o prêmio não ter ainda sido instituído.
            Dentre toda a obra de Greene, avulta, sem dúvida, “O poder e a glória”. Garcia Marques foi lembrado para ganhador do Nobel por causa de “Cem anos de solidão”. Teria sido o caso de José Saramago com “O dia da morte de Ricardo Reis”. Juan Rulfo bem o merecia com “Pedro Páramo”. Também foi muito estranho que a Academia não tivesse jamais cogitado de conferir a láurea a Guimarães Rosa, cuja obra é, sem dúvida, da mesma grandeza (ou superior) a de Garcia Marques. Borges também passou ao longe na consideração do Nobel.
            Tivesse ou não esperado pela premiação, Greene a justificaria pelo conjunto de sua obra, mas principalmente por seu romance “O poder e a glória”, que é um clássico em toda a linha.
            Greene morou na suíça nos fins de seus dias e ali encerrou sua trajetória. Há algumas biografias sobre sua vida e, claro, obra. Não li nenhuma. O que sei dele é suficiente. Fiz duas leituras de “Fim de caso”, um de seus melhores romances. O filme equivale ao livro. Embora prefira o livro.
            Ainda que sem ser contemplado com o Nobel, Greene está colocado entre os maiores autores de todos os tempos. Em 2004, comemorou-se seu centenário de nascimento. 

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