Total Pageviews

Friday, October 7, 2016

CLARICE - Hamilton Alves





                                   Sempre me deixei devorar pelo olhar brejeiro ou quirguiz de Clarice (limitei-me a vê-la nos retratos), como era o olhar de Me. Chauchat, namorada de Hans Castorp ou por quem este se apaixonou, em “A Montanha Mágica”. Acho que Chauchat e Clarice tinham a mesma origem eslava. Daí o tipo de olhar que ambas tinham. Clarice era uma mulher linda. Não admira que tivesse tantos homens que se apaixonaram por ela em prosa, em verso e em pessoa.
                                   Vinícius Alves vem de fazer uma entrevista hipotética com ela. Aliás, muito bem feita, aproveitando-se do que disse em seus livros.
                                   Tudo que li de Clarice resume-se a crônicas e contos. Fui ler, por sugestão de um amigo, “A hora da estrela”. Não sei se foi Moacyr Scliar que disse que, se tivesse que escrever um prefácio, gostaria de fazê-lo sobre esse livro.
                                   Achei a novela de Clarice uma coisa meio mal bolada.
                                   Não posso julgá-la como escritora, a não ser pelas crônicas e contos. Não vou falar de suas novelas ou romances, não lidos por mim. Nem provavelmente vou lê-los. Tem muita coisa enfileirada no meu interesse de leitura que é provável que não será suficiente todo o tempo que lhe dedicar para esse fim.
                                   Uma pergunta que Vinícius lhe fez sobre se tinha medo da morte respondeu: “morrer é ininterrupto”.
                                   Só uma pessoa dotada de um intelecto muito especial daria uma resposta dessas.
                                   Outra que lhe fez envolveu a questão do estranhamento. Disse: “Quando estranho uma pintura aí é que é pintura; quando estranho a palavra aí é que ela alcança sentido; quando estranho a vida aí é que começa a vida”. É outra resposta que mostra sua versatilidade mental. Ou sua observação clara das coisas.
                                   Se pudesse lhe faria uma pergunta: “Quem é Clarice Lispector?”
                                   Não imagino sua resposta. Talvez nada dissesse. Ou saísse pela tangente. Daria ma resposta enviesada. Ou escapista.
                                   Uma auto-descrição é sempre uma coisa subjetiva. Ou dificílima. Ou envolve grande risco de faltar-se com a verdade.
                                   Quem somos?
                                   Não o sabemos.
                                   As pessoas de destaque como Clarice ou sem expressão, como a maioria dos seres anônimos, que atravessam lado a lado por nós nas ruas, nada sabem a seu respeito. No caso dela, revelava-se no que escrevia, como nessa entrevista inventada  pelo Vinícius.
                                   Artistas de um modo geral tem uma luz própria. São guiados por alguma forma misteriosa de ver a vida e o mundo.
                                   Claro, são pessoas de carne e osso como todo mundo.
                                   Mas no contato com uma mulher como Clarice deve-se notar toda a diferença.
                                   Suponho que, mesmo na mais atroz banalidade que dissesse, em algum momento, produziria uma experiência muito particular em qualquer um.
                                   Toquinho dizia que conviver com Vinícius de Moraes era uma benção. Certamente, Toquinho expressava justamente esse deslumbramento de ter essa fonte de beleza permanente que era Vinícius. Era um ser humano como outro qualquer, mas com essa marca distinta, que fazia com que fosse único. Assim como devia ser o caso muito particular de Clarice. A entrevista inventada por Vinícius é uma revelação de sua maneira muito especial de ser. Ou de reagir ao fenômeno existencial que nos toca a todos.



(julho/08)                               












No comments:

Post a Comment