Sobre
esse tema (que, afinal não é verdadeiramente um tema) José Carlos Oliveira
escreveu talvez uma de suas melhores crônicas num livro de sua autoria, que
guardo com muito carinho, a atestar minha admiração por sua grande qualidade de
cronista.
Carlinhos
conta que, sem assunto para a crônica diária, por várias vezes enfiou o papel
na máquina de escrever. Chegou a compor três ou quatro frases e não conseguia
ir adiante. Tirava o papel do rolo da máquina, amassava-o e o jogava pela janela.
Resolveu
sair à rua, na direção dos bares, onde
o esperavam as garrafas (no dizer dele).
Saiu
andando de espírito vazio pela orla do mar, a fim de espairecer ou, quem sabe,
à procura de assunto.
Encontrou
amigos, viu as gaivotas em seu canto estridente, numerosas, flutuando no mar ou
esvoaçando pelo ar, mas nada do assunto aflorar.
Escrevia
diariamente para o Jornal do Brasil nessa época. Nada pode ser mais terrível do
que a necessidade de redigir uma lauda e meia e não encontrar um mísero tema.
Quem,
cronista profissional, não passou já por tal tipo de crise?
Quando
o assunto não quer dar presença de si não adianta persegui-lo. O jeito é fazer
como Carlinhos. Sair à rua, tomar o ar fundo, deixar as coisas acontecerem, até
que a luz se faça ou não se faça.
A
solução é voltar à redação ainda de espírito vazio, sem nenhuma possibilidade,
a mais remota, de achar o tema para desenvolvê-lo.
O
jeito que há, em tal circunstância, é encher lingüiça, como certamente fez
nessa crônica, conduzindo-a até com certa maestria, finalizando assim:
“Fiz
outra bolinha de papel, joguei pela janela, fechei a máquina... Fechei a porta,
fechei a garganta, fui andando pela beira do mar, mais certo do que nunca de
que nada sucede na beira do mar”.
Essa
crônica, que finda dessa maneira tão deplorável, narrada por Carlinhos, tem o
titulo de “A fera em liberdade”, colhida das paginas 37/38 de seu livro “A
revolução das bonecas”.
Não
posso me queixar como o fez Carlinhos sobre falta de assunto. A última
experiência vivida por mim como cronista diário foi num jornal local, substituindo
seu titular, cronista de boa cepa, Flávio Cardozo. Aceitei o desafio que me foi
proposto de substituí-lo por um período de tempo considerável. E, agora, no “lesma”,
me pespegaram o título de “cronista diário”. Nada mais tenho feito que mal
traçadas croniquetas, que não chegam a ser diárias.
Se
tivesse que arrostar uma coluna num grande jornal (ou mesmo modesto),
diariamente, talvez me afligisse o drama de Carlinhos, que se viu alcançado num
belo dia pela falta de assunto.
E,
para um cronista, que se vê na obrigação de cumprir seu ofício não há, na
verdade, suplício maior.
Faria
também, certamente, uma bolinha de papel, atiraria pela janela, fecharia a máquina,
e seguiria pela beira do mar...
(agosto/08).
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