Num
fim de semana desses recebi a visita de um amigo. Também ele escritor. Também
ele poeta.Também ele um aficionado da arte.
A
certa altura, disse-me:
-
Olha, cara, se não fossem a literatura e a música, o que restaria para mim
neste mundo.
Estive
a pique de lhe dar uma resposta. Diria mais ou menos o seguinte:
-
O que seria de mim se dependesse da literatura e da música?
Com
essa antítese queria lhe explicar que o homem não deve depender de nada para
garantir sua paz ou sua acomodação neste planeta.
Mas
não cheguei a externar tal pensamento.
Deixei
que viajasse na maionese, ou seja, que fizesse depender sua ligação com o mundo
da literatura e da música.
Logo
depois, tentei expressar o que pensava de outro modo.
-
Para mim, a melhor música é o silêncio. Não há sinfonia que o supere.
Ergueu-me
os olhos grandes como os de um índio (no que me parecia que era um pouco) e
revelou-se meio admirado do que acabara de dizer. Ou intimamente poderia não
concordar comigo.
Música,
para ele, era música tal como tradicionalmente se concebe. Essa história de
silêncio ser também música não batia muito bem com sua visão das coisas,
certamente.
Mantínhamos,
em nossa conversa, canais abertos de comunicação, de modo tal a nos permitir
conceitos de todo o tipo. Ou fórmulas das mais variadas a respeito de todas as
coisas.
Mesmo
porque não há outra atitude mais correta a ser adotada com respeito a um
visitante.
Faz
parte da cortesia que lhe é devida.
Mas
ele mostrava-se suficientemente apto em seus comentários para criar um conflito
insanável de qualquer natureza.
Até
que chegou, em dado momento, num ponto crucial, quando quis definir o que era
crônica.
Lançou
no ar a frase:
“A
crônica é...”, mas não a concluiu.
Percebi
que esbarrava na definição, que é, em si mesma, indefinível.
Olhei
um pássaro num galho de uma árvore, muito próximo de onde estava. E ao pássaro
quase lancei a pergunta:
-
O que é a crônica?
O
pássaro o saberia?
Poderia
achar a definição na qual o meu amigo se mostrava bloqueado?
Mas
o pássaro, nem bem ousara lhe propor tal indagação, voou para outras bandas.
O
meu amigo continuava a tartamudear, indeciso:
-
A crônica é...
Quem
é que, na verdade, saberá dizer o que a crônica é?
(set/08)
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