Fernando Karl apresentou uma entrevista que é
digna de figurar neste blog Lesma-Lerda, do Vinícius, (ia dizer que é digna de
figurar nas grandes revistas e jornais, mas que diabo!, que diferença abismal
existe entre um e outros?). A imprensa convencional tem suas regras.
Lesma-Lerda (não sei se vocês já notaram) segue outro caminho, abrindo espaço
para gente de talento, que, em geral, está fora de circuito ou das ditas
regras.
Karl
entrevistou em 2002, como ele conta a escritora Hilda Hilst, detentora de
vários prêmios literários. Mas danem-se os prêmios, que nem sempre contemplam
os bons escritores. Não vou falar da qualidade da entrevista. Seria supérfluo
dizer que se trata de uma entrevista dessas que se guarda num relicário para a ler sempre, que levanta em cada um de nós,
leitores, algo que jaz fenecido ou que nos faz de alguma forma estremecer ou
deslumbrar pelas palavras que se captam aqui e ali, cheias de alguma coisa nova
e luminosa, que uma mulher com sua experiência de vida (e a liberdade pessoal
de viver) consegue nos tocar, como o fato, por exemplo, de ter procurado Marlon
Brando em Paris para conhecê-lo. Bem, depois de “O último tango em Paris”, de
Bertolucci, em que Brando
excedeu-se na arte de representar, com uma espontaneidade incomparável, quem
não desejaria encontrá-lo um dia ao acaso para lhe apertar a mão simplesmente
ou lhe dar um abraço ou idiotamente ficar admirando-o a sua passagem, com
aquele jeito meio moleque de andar?
Talvez
não tivesse sido a melhor resposta, mas registrei a seguinte a uma pergunta do
Karl: “Há momentos que você viveu a perfeição, a beleza, e existe uma nostalgia
dentro de cada um de nós, que seria Deus, o inominado. Penso que o homem tem a
nostalgia da santidade, da perfeição, da luz”.
Não
digo que essas palavras soem novas aos meus ouvidos, pois esse tema tem sido
objeto de minha busca no significado das coisas todas que nos cercam, numa
flor, num por de sol, na sombra, numa folha, num pássaro, num peixe, enfim, em
tudo que compõe a vida para apurar minha percepção do mundo, numa espécie de
culto à noese.
Agora
mesmo, leio esse homem também perseguido por essa obsessão de procurar a beleza
que se entranha em tudo, que é um reflexo de uma beleza original, a beleza
suprema – Ernesto Sábato, com seu livro há pouco lançado – “Resistência” – em que, em certos momentos,
algo parecido com o que Hilst diz descobre-se em alguns trechos dessa pequena
obra.
Qual
é a criatura despojada de ânimo e de sentimentos, como Hilst o revela que ouse
dizer que, quando encontrou Brando, em Paris (recebeu-a muito bem, trocaram
algumas poucas palavras), pretendia dormir com ele. Marlon (diz ela muito
frustrada) teve outra opção, estranha para ela, mas afinal era uma opção e opções
não se discutem, por mais absurdas que possam nos parecer.
Como
Fernando deixa perceber nessa entrevista, Hilst era uma mulher belíssima a esse
tempo. Era mais uma no vasto acervo de Brando. E mais uma, menos uma pouca
diferença fazem.
Nunca
a li, o que sem dúvida é uma perda para mim.
Uma
que outra vez me defronto com seu rosto envelhecidamente bonito, que revela uma
vida interior intensa.
Nas
poucas coisas que diz nessa entrevista descobre-se com muita clareza o ser
humano Hilda Hilst, que pauta sua vida por padrões e códigos que, no primeiro
momento, surpreendem, mas que revelam sua distinção.
O
que se sente é que procura acender uma luz para que sintamos “a nostalgia da
santidade e da perfeição”.
(maio/08)
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