Há
pouco, remetendo à crítica de um de nossos articulistas (não cronista) - no que
há uma fundamental diferença - que dizia ser a crônica um gênero não literário
e, no dizer, ainda, de outro cronista, que renegou a raça, Carlos Heitor Cony,
datado, e que, por isso mesmo, não se presta mais a ser publicada em jornal que,
em nosso tempo, só admite a informação e nada mais (como se enganou!), voltei à
defesa desse gênero polêmico, que considero (não apenas eu) gênero literário
por excelência.
Quanto
à pecha de ser datada (segundo Cony), lembro algumas crônicas (para citar
apenas essas) que perduram e haverão de perdurar pelos tempos a fora. A
primeira delas é a famosa de Rubem Braga, o sabiá da crônica, como era chamado,
com o título “O conde e o passarinho”. Foi Joel Silveira que disse que, quando
leu esse livro de Braga, desceu de sua cidade natal, em Aracaju (Sergipe), ao
Rio, para conhecê-lo e não apenas para tal fim, mas compor com ele um grupo de
jornalistas que, à época, produziram o que houve de melhor no jornalismo
daqueles tempos (cite-se “O comício”, que era dirigido por Braga, Joel e um
terceiro que não lembro). “O comício” era do mesmo teor revolucionário de jornalismo
de “O Pasquim”, que apareceu no cenário da imprensa brasileira, como sabido, após
a “redentora” (por volta de 1964).
Editou-se
um livro de crônicas do Braga há pouco, com o título “200 crônicas escolhidas”.
Encadernei meu exemplar e lhe pus o título (bem mais condizente) de “O conde e
o passarinho”. Essa crônica, quem a lê ainda agora, constata que nada perdeu de
seu encanto com esse mais de meio século decorrido desde quando foi escrita.
Citaria
uma crônica de Paulo Mendes Campos sobre “Alice no país das maravilhas”, com que
presenteou a filha no dia de seu aniversário, em que Paulo se propõe a
lhe passar os grandes ensinamentos de Alice em alguns momentos culminantes
dessa insuperável história de Lewis Carrol.
“O
homem nu”, de Fernando Sabino, é outro momento imortal da crônica, que
igualmente desafia o passar dos anos.
Drummond
é autor também de algumas crônicas antológicas. Há uma que compôs para uma
antologia, editada pela editora Sabiá, de que eram donos o Braga e Sabino, que é dessas que postulam a
perenidade - “Caso de canário”.
Manuel
Bandeira é outro que se situa, ao lado desses eminentes homens de letras, com
uma sobre uma passagem de ano no bar da Brahma, que existia no extinto Hotel
Avenida, no Rio, que não há nada de mais engraçado e perfeito.
Entre
nós, cito Silveira de Souza, Flávio Cardozo e Ilmar Carvalho, como sendo
autores de crônicas que ganharam também foros de imortais pelo ineditismo ou
pelo tema tratado: a do Silveira é um misto de crônica e conto, “Para a
rodoviária”. A do Ilmar é igualmente digna de figurar entre as melhores escritas
em todos os tempos, publicada numa antologia universal da crônica, “Da vantagem
de ser jovem no Estreito”. Há pouca coisa, no gênero, que tenha sido concebida de
forma tão leve, tão verdadeira, tão bonita. A do Flávio, que me deu de
presente, com afetuosa dedicatória, traz o título “Bem aventurados os que
andaram de trem”, que é dessas coisas de se colocar numa moldura e ler toda a
manhã ao se iniciar uma nova jornada pela vida.
Pode-se,
diante de tais exemplos, inquinar-se de datado esse gênero insubstituível da
literatura?
(agosto/08)
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