Orlando
mal despertou foi à janela. E viu que peneirava uma chuvinha e uns trovões, de
longe em longe, ribombavam. O céu toldado de nuvens escuras.
Sentia-se
meio encurralado pela chuva, porque a rotina era tomar o café, arrumar-se e ir
ao escritório.
Sim,
estava já às voltas com os problemas rotineiros de um homem, a quem compete, no
turno de um dia, fazer certas coisas, tomar certas providências, entrar em
contato com fulano e sicrano - enfim, a mesmice de todos os dias.
Lembrava-se
ainda do pesadelo que, na noite passada, o acometera. Queria recompô-lo, embora o tivesse levado a uma
dura provação, que, em geral, provocam todos os pesadelos. Era uma coisa mais
ou menos assim: tinha um emprego numa repartição e lhe incumbiam de uma nova
tarefa. Fora trabalhar noutro setor. Quando chegou lá, porém, deparou-se com
uma sala vazia, sem mobiliário, sem nada, só com uma porta, nada mais.
Afinal,
perguntou-se, o que teria de fazer ali? Resolveu sair e se informar com alguém.
Mas quando fez isso, a porta estava trancafiada e viu-se atônito.
Essa
espécie de pesadelo era-lhe recorrente. Sempre estava metido numa situação
labiríntica, sem saída, bloqueado nesses espaços sempre vazios.
Felizmente,
tudo não passara de fantasia.
Estava
de volta à realidade.
E
bem considerando as coisas, o que lhe oferecia a realidade?
Uma
manhã nebulosa, com chuva, trovões, sem poder arredar pé de casa para
cumprimento das obrigações de sempre.
Bem
verdade que a chuva lhe concedia uma espécie de trégua. Apaziguava-o .
Fez
o desjejum, aprontou-se, a mulher lhe disse alguma coisa numa voz apagada, que
não conseguiu logo entender. Por isso, perguntou-lhe:
-
O que é?
-
Você vai ao escritório com esse tempo?
-
Pois é... não sei... se a chuva aumentar, como parece ser o caso, o volume de
nuvens é grande, vou sair só à tarde.
- Não esqueça de pegar o carro na garagem.
Temos de ir ao sacolão.
Uma
das coisas que consta de sua agenda semanal é o compromisso de fazer compras no
sacolão.
Mas
ele não cogitava dessas tarefas domésticas. Ainda lhe aturdia o pesadelo que
sofrera na última madrugada.
- Por que será que um homem tem que sofrer
pesadelos? Que mistérios há na mente ou no cérebro que o conduzem a isso? -
indagava-se.
Bem,
chovia, uma chuvinha rala, com perspectivas próximas de engrossar.
A
chuva era um fenômeno que ele sempre bem dizia. Havia uma certa beleza na
chuva. Um vago conforto psicológico.
Ficou
ali, estático, atrás dos vidros da janela, procurando achar uma brecha no
pesadelo, na chuva, no mundo, em si mesmo.
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