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Friday, June 28, 2013

CHUVA - Hamilton Alves


Orlando mal despertou foi à janela. E viu que peneirava uma chuvinha e uns trovões, de longe em longe, ribombavam. O céu toldado de nuvens escuras.
Sentia-se meio encurralado pela chuva, porque a rotina era tomar o café, arrumar-se e ir ao escritório.
Sim, estava já às voltas com os problemas rotineiros de um homem, a quem compete, no turno de um dia, fazer certas coisas, tomar certas providências, entrar em contato com fulano e sicrano - enfim, a mesmice de todos os dias.
Lembrava-se ainda do pesadelo que, na noite passada, o acometera. Queria  recompô-lo, embora o tivesse levado a uma dura provação, que, em geral, provocam todos os pesadelos. Era uma coisa mais ou menos assim: tinha um emprego numa repartição e lhe incumbiam de uma nova tarefa. Fora trabalhar noutro setor. Quando chegou lá, porém, deparou-se com uma sala vazia, sem mobiliário, sem nada, só com uma porta, nada mais.
Afinal, perguntou-se, o que teria de fazer ali? Resolveu sair e se informar com alguém. Mas quando fez isso, a porta estava trancafiada e viu-se atônito.
Essa espécie de pesadelo era-lhe recorrente. Sempre estava metido numa situação labiríntica, sem saída, bloqueado nesses espaços sempre vazios.
Felizmente, tudo não passara de fantasia.
Estava de volta à realidade.
E bem considerando as coisas, o que lhe oferecia a realidade?
Uma manhã nebulosa, com chuva, trovões, sem poder arredar pé de casa para cumprimento das obrigações de sempre.
Bem verdade que a chuva lhe concedia uma espécie de trégua. Apaziguava-o .
Fez o desjejum, aprontou-se, a mulher lhe disse alguma coisa numa voz apagada, que não conseguiu logo entender. Por isso, perguntou-lhe:
- O que é?
- Você vai ao escritório com esse tempo?
- Pois é... não sei... se a chuva aumentar, como parece ser o caso, o volume de nuvens é grande, vou sair só à tarde.
- Não esqueça de pegar o carro na garagem. Temos de ir ao sacolão.
Uma das coisas que consta de sua agenda semanal é o compromisso de fazer compras no sacolão.
Mas ele não cogitava dessas tarefas domésticas. Ainda lhe aturdia o pesadelo que sofrera na última madrugada.
- Por que será que um homem tem que sofrer pesadelos? Que mistérios há na mente ou no cérebro que o conduzem a isso? - indagava-se.
Bem, chovia, uma chuvinha rala, com perspectivas próximas de engrossar.
A chuva era um fenômeno que ele sempre bem dizia. Havia uma certa beleza na chuva. Um vago conforto psicológico.
Ficou ali, estático, atrás dos vidros da janela, procurando achar uma brecha no pesadelo, na chuva, no mundo, em si mesmo.


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