Outro
dia, numa resenha para um jornal, Sérgio Augusto revelou que os jornalistas de
cultura já não são tão requisitados ou sequer considerados com a importância
que desfrutavam há uns tempos passados. E não faz tanto tempo assim. De ano para
ano, tais profissionais (uma classe bastante numerosa) vêem paulatinamente
decair seu prestígio. “A coisa está feia” – diz Sérgio a certa altura de seu
artigo. Ele se referia a um encontro desses profissionais recentemente realizado
nos Estados Unidos, em que o tema geral dos debates foi exatamente o de saber
até que ponto se deteriorava ou perdia prestígio sua presença nos jornais. O
certame trazia o nome de National Critics Conference. O encontro teve por local
a cidade de Los Angeles, em maio do corrente ano.
O
resultado colhido através do depoimento de participantes foi de certo modo
acabrunhador, pois todos revelavam que vinham perdendo gradativamente terreno
na mídia e o fenômeno é que decaia, a olhos vistos, a busca de informação cultural
através da imprensa especializada (ou dos jornalistas que a representavam). Mas
nem tudo foram lamentações. Houve pequeno grupo que via como passageiro o
fenômeno, embora também reconhecesse que os tempos não são muito favoráveis,
tanto é que o espaço de alguns jornais já não contempla matéria cultural.
Daria
para sentir algo semelhante na imprensa brasileira? Quem são os jornalistas que
ainda assinam artigos ou resenhas de cultura? São muitos, poucos ou uns gatos
pingados? Não conheço mais que meia dúzia de nomes dos que formam no primeiro
time. Pode ser até que haja outros pintando aqui e ali, mas os grandes nomes
conhecidos não são muito numerosos. Formam um pequeno grupo. Nos Estados
Unidos, que é incomparavelmente mais rico do ponto de vista de estrelas de
primeira grandeza no jornalismo, perderam-se recentemente as figuras
exponenciais de Pauline Kael, crítica de cinema, e Susan Sontag, que abrangia
uma gama muito grande de áreas culturais, desde a literatura, passando pela pintura,
pelo teatro, cinema, etc.
A
baixa desses dois nomes foi muito sentida pelos jornais que acolhiam sua
opinião com muita freqüência, sem falar em outro monstro sagrado, H.L. Mencken,
podendo-se mencionar ainda Clement Greenberg, que foi por vários anos o papa da
crítica de artes visuais, além de outros de menor porte, mas que vinham se
mantendo inalteradamente no pódio dos nomes mais cotados do jornalismo cultural
dos EUA.
Com
o desaparecimento de tais figuras, a imprensa viu-se servida por uma casta
muito heterogênea, sem alcançar o nível daqueles – o que pode ter sido
responsável, em grande parte, pela queda de qualidade dos novos valores.
Podem-se
fazer testes locais ou pesquisas pelo índice de venda de nossas livrarias. A
bem dizer, temos cinco livrarias de porte considerável. Em contato com seus
gerentes, que conhecem bastante bem o volume de vendas, a informação é de que a
situação não é das melhores. Seria o caso, por exemplo, de um Kafka,
Dostoievski, Tolstoi, Tchecov, Beckett, Hemingway, esses grandes nomes, que, em
qualquer época – a mais adversa para livreiros – são bastante procurados.
Que
dizer dos escritores regionais ou brasileiros? Quem é que vende mais entre
eles? Um primeiro nome assume, desde logo, a liderança. Nem precisa dizer quem
é. Ou precisa? Paulo Coelho no topo.
Quem
mais dentre os mais conhecidos? Talvez se possam citar Cony, Rubem Fonseca, Lígia
Fagundes Telles, Luiz Fernando Veríssimo, Moacir Scliar e alguns outros.
As
editoras continuam rejeitando maciçamente nomes novos, com receio de que o
mercado, na forma como vem reagindo até com os grandes nomes, não corresponda à
menor expectativa.
Qual
a solução para o problema?
Não
há aqui a realização de uma National Critics Conference como em Los Angeles se fez em
maio último, a fim de analisar miudamente a questão.
Há
pouco, foi lançada uma coleção de grandes títulos e de autores de fama
internacional, com suas obras primas, nem por isso a venda foi um sucesso. Até
houve o caso de uma obra das mais festejadas pela crítica mundial, “Morte em
Veneza”, de Thomas Mann, que numa banca ficou por três ou quatro meses boiando.
Adquiri dois exemplares. Como um terceiro havia sobrado, acabei também o
adquirindo para dar de presente a um amigo.
Trata-se
de um clássico internacional e de um escritor premiado com o Nobel.
Imagine-se
o que ocorre com quem não alcançou tal notoriedade!
Apesar
disso tudo, o livro ainda vende. O quadro não é tão desalentador assim. Há apaixonados
por literatura, que são capazes de atos de loucura para adquirir uma obra
literária, que constitua uma raridade. É, claro, um pequeno grupo, que
evidentemente não pode mudar muito o panorama.
O
jornalismo cultural está intimamente relacionado ao comércio de arte. Quando um
acabar ou sentir o abalo de indiferença de público, o outro também cairá pelas
beiradas. Um suporta ou depende do outro.
Como
o fenômeno da queda de prestígio desses profissionais foi constatado e
proclamado no encontro da National Critics Conference, é possível admitir-se
que isso tenha fortes reflexos no baixo interesse por arte do público, que
prefere entretenimentos por via eletrônica, concentrando a atenção
principalmente de jovens. Ou então o fato se explica pela baixa qualidade das
pessoas para as quais a literatura ou as artes de um modo geral não têm mais
nada a lhes dizer. Ou não constituem, para eles, um atrativo como há tempos
passados.
O
mundo se deteriora sob vários aspectos, seria o caso de dizer-se?
Sem
exageros, o fato é que o mar não está pra peixe.
Mas
ainda há quem tenha uma visão animadora diante das piores perspectivas.
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