Fui,
como todo o garoto de minha geração, um fanático por HQ (Histórias em
Quadrinho). Há, hoje, como sabido, no mundo todo, jovens e velhos (estes
passando a barreira notável dos oitenta anos) que ainda se dedicam com
interesse quase psicótico por qualquer coisa que diga respeito à HQ e são
capazes de empregar uma nota preta na aquisição de um álbum do Fantasma Voador,
do Mandrake ou do Príncipe Namor (também conhecido por Príncipe Submarino), tal
o fascínio que esses personagens exercem sobre tais pessoas.
Colecionei
até certa idade, se me lembro bem, gibis de todos os tipos e tamanhos. Hoje, se
os tivesse comigo ou conservado, teria um acervo avaliado em alguns milhares de
reais, porque ainda tem doido de sobra, como disse, que é capaz de pagar boa
grana por um simples gibi, que, em meu tempo, na banca do Beck, na Praça
Quinze, custava 0,50 centavos. Minha querida avó tirava esse dinheirinho ganho
com tanto sacrifício de suas economias para satisfazer o desejo incontido de
seu neto à compra de um exemplar de Gibi semanal com as histórias inesquecíveis
de Bronco Piler e Castor, Polícia Montada, Doutor Kildare, Zorro e seu amigo
Tonto e tantas outras que enriqueceram a minha infância de fantasia. Afora, “O
Globo Juvenil Mensal”, “O Guri” e outras edições do gênero, que eram também
igualmente objeto de meu fascínio.
Até
um certo tempo, lembro-me que meus gibis formavam pilhas. Havia então o
troca-troca, que, em certos casos, provocou muita briga entre os aficionados.
Furtos eram incontáveis. Cada qual procurando se apropriar dos gibis alheios. E
eu não era exceção à regra.
“O
Homem Aranha” estava inscrito na galeria dos heróis do “Gibi” já àquela época.
Figuravam, entre os mais apreciados, Super-Homem, Fantasma Voador, Tocha
Humana, etc. Mas não chegou a ser um personagem que figurasse na minha
preferência. Há coisas assim inexplicáveis. Por que não me interessei pelo “Homem
Aranha”? Não exercia atração sobre mim. Via aquele sujeito, com uma farda já de
si pouco simpática, a subir pregado às paredes, os arranha-céus. Voava como
Marvel e o Super-Homem. Também não cheguei a me apaixonar pelo Capitão Marvel,
que, a meu ver, não tinha uma cara que o recomendasse. Não chegava perto do
“Super-Homem”, que imitou em quase tudo. Não dava para comparar um e outro. O
“Super-Homem” era melhor em tudo e convencia mais, mesmo voando, que era uma de
suas especialidades.
Bem,
o fato é que “O Homem Aranha” me passou à margem, sem maior interesse. Acho até
que, para a minha geração, já apaixonada e enfeitiçada por outros heróis de
maior calibre, “O Homem Aranha” (a não ser que haja aí na platéia quem queira
resgatá-lo em sua fama) não chegou a empolgar. Passou-nos como um personagem
secundário. Que me perdoe quem discorde.
Mas
agora, sem um plano preconcebido, fui a uma videolocadora e ali, em destaque,
anunciava-se o filme “O Homem Aranha II”, dirigido por um cineasta com uma
folha corrida já bem recheada de bons filmes, Sam Raimi, e com atores (Tobey
Maguire no papel de Homem Aranha) não tão conhecidos, mas que, apesar disso,
conseguem ter um excelente desempenho, como, de um modo geral, o elenco todo
impressiona bem.
Antes
de levar o filme tive o cuidado de perguntar à locadora sobre a opinião dos que
já o haviam assistido. Obtive a informação de que, de um modo geral, o filme
vinha agradando a gregos e avaianos, pelo que resolvi, numa noite que convidava
ao recolhimento, pois chovia a cântaros, levá-lo para ver o bicho que ia dar.
“O
Homem Aranha” – só agora o descubro (antes tarde do que nunca) – expele de seus
punhos uma gosma elástica, que deve ser a mesma (ou semelhante), parodicamente,
com que as aranhas comuns armam suas teias tão resistentes até a vendavais. Com
tal gosma gruda-se às paredes, sobe nos prédios, faz uma rede resistente até
para reduzir a velocidade de locomotivas ou para grudar qualquer coisa, entre
as quais, nesse filme, o seu grande inimigo, que se arma de potentes braços
mecânicos, capazes de destruir tudo. Lembra muito esse personagem o inimigo nº.
1 de Batman (O Homem Morcego), o maquiavélico Pingüim, que é perito em armar
tantas ciladas para seu terrível combatente.
E,
vendo o filme, comparável aos melhores que já assisti, deu-me uma nostalgia e
ao mesmo tempo um atroz arrependimento de não ter incluído, em meu tempo de
ledor de Gibi, “O Homem Aranha” entre meus heróis preferidos. Nesse filme ele
está soberbo. Mas sua história pessoal é triste. Não tem o direito de amar,
como todo o ser humano. Sua namorada se decepciona com ele, quando, na pele de
um homem comum, por ser sempre, em virtude das funções por ele exercidas,
desconhecidas da namorada de ser um outro personagem ou de habitar-lhe a
persona heróica de um ente com poderes especiais, um retardatário, que nem
mesmo a sua estréia numa peça, em vezes seguidas, comparece, com a cadeira que
lhe era destinada regulamente vazia, demonstrando sua inexplicável ausência ou
seu desinteresse (assim visto por ela) de apreciar seu espetáculo.
Mas
enquanto ela se exibia na peça de teatro, já atriz famosa, “O Homem Aranha”
andava grudado nos prédios e voando pela cidade na perseguição de bandidos ou
de seu truculento inimigo, “Dr. Octopus”.
Em
matéria de filme de aventura vou dizer uma heresia: supera “Flash Gordon no
Planeta Mongo”, pois “O Homem Aranha” me pareceu mais convincente em sua arte
de andar pelos ares e de ser capaz de suportar a queda de um conjunto de metais
pesadíssimos na defesa de sua namorada.
Mas
no fim, quando deve comparecer a uma Igreja para casar-se com outro, o noivo a
espera em vão, porque em desabalada carreira vai em busca de seu namorado
retardatário, “O Homem Aranha”, agora em carne e osso, para lhe revelar que
“sem ele não pode viver”.
A
luta travada entre “O Homem Aranha” e o “Dr. Octopus”, no fim, é um grande
momento, tal a ferocidade dessa luta, diria que muito mais impressionante da
que Starret trava com Shane em “Os brutos também amam”.
E
eu, no fim das contas, que julgava levar para casa um filme para vencer uma
noite ilhado (ou recolhido) por um aguaceiro, descobri que havia assistido a um
clássico do cinema de aventuras, que se incorporará a meu acervo particular dos
filmes que conseguiram produzir em mim uma lágrima. Uma lágrima reverencial a
esse herói, “O Homem Aranha”, na luta sem quartel do bem contra o mal.
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