Total Pageviews

Monday, July 1, 2013

UM FILME POR DIA - Nem mesmo um grande crítico escapa de ser às vezes parcial; é a clara dedução da leitura do livro de Moniz Viana. - por Hamilton Alves

 

            Organizado por Ruy Castro, que nessa matéria de escolher material de escritores badalados na imprensa do Rio há várias décadas atrás, é sem dúvida alguma mestre, lança-se, agora, “Um filme por dia” (ed. Companhia das Letras, 415 págs., R$ 48,00). Há pouco, nos ofereceu o material legado por outro grande crítico de cinema, José Lino Grünevald, que também pontificou por vários anos a fio no desaparecido “Correio da Manhã” por obra e graça da ditadura militar que, entre outros serviços nocivos, prestou mais esse à cultura brasileira.
            Moniz Viana foi tido, em seu tempo, no mesmo “Correio da Manhã”, como o grande “cobra” da crítica cinematográfica. Foi tal seu prestígio (que ainda hoje dura) como analista de cinema, que praticamente exerceu uma espécie de liderança ou de “magister dixit” no assunto. Quem queria saber se um filme valeria a pena ou não tinha que recorrer à palavra do mestre.
            Dá para perceber nesse livro, em boa hora lançado, pois resgata todo esse material precioso de crítica do jornalista, o quanto Moniz foi efetivamente um mestre no conhecimento da sétima arte. Em dois momentos, parece chegar a um extremo de detalhismo com respeito a dois grandes filmes, que ainda fazem cabeça e coração de muita gente, “A marca da maldade” (Touch of evil) e “2001, uma odisséia no espaço” (2001, a space Odyssey), de Stanley Kubrick, que é, hoje, à unanimidade, considerado um marco no cinema.
            Nesse último caso, o perfeccionismo e a precisão nas informações e, de resto, as referências à fita são de tal maneira abundantes e, sobretudo, a análise é tão concisa e chegar à clareza do que a obra representa, que se sai da leitura desse texto como num estado de transe, tal é o seu magnetismo.
            Não obstante o fato notório (mostrado pela totalidade de seus artigos) de que estamos, inegavelmente, diante de um gênio da crítica cinematográfica, que Ruy Castro ressalta, em certo momento, que não teve dentro ou fora do país, no mesmo período, quem rivalizasse com ele, Moniz, como todo o crítico, foi humano, ou seja, incorreu, a meu ver, em algumas escorregadelas. O fato de não se ter incluído no rol dos filmes que fazem parte do livro nenhuma referência à obra de Chaplin é uma dessas coisas incompreensíveis. Um amigo chegado a Moniz (não posso revelar o nome), com quem tive há pouco ligeiro contato por telefone, no Rio, me dizia que a exclusão é explicável: Moniz não gostava do cinema de Chaplin.
            Não dá para crer. Chaplin é uma unanimidade universal no que toca a sua grandeza.
            Mas há outro excluído da lista: “O pagador de promessas”, de Anselmo Duarte. Também este filme, ao que se comenta, entrou na categoria dos filmes pouco ou nada apreciados por Moniz.
            Sobre “Deus e o Diabo na terra do sol”, ele considera que, depois de “O cangaceiro”, é o melhor filme nacional. Glauber, registra-se no livro, era desafeto de Moniz por um tempo. Depois fizeram as pazes. Glauber ardia de saber qual a opinião de Moniz sobre seus filmes. Ficou muito aborrecido quando Moniz escreveu que não gostara de “Terra em transe”. Mais tarde, elogiou “Deus e o Diabo...”. Ora, o filme de Anselmo foi premiado em Cannes, entre outros que hoje constituem ou pertencem, de alguma maneira, à história da sétima arte, como, só para citar um, “O anjo exterminador”, de Buñuel. Dar preferência a “Deus e o Diabo” em relação ao “O pagador...” é, no mínimo, um disparate.
            O que teria levado Moniz Viana a se posicionar assim frente à tal questão? Tinha alguma pinimba com Anselmo? Seria guiado por um espírito de parcialidade? Não se sabe.
            Outro tema é sua ojeriza pela “nouvelle vague” e suas diatribes contra cineastas da altura de Resnais quando dirigiu “O ano passado em Marienbad”, e Godard, cuja obra foi considerada de baixo nível ou de não tanta qualidade como a crítica a considerou. Também malhou “Hiroshima, mon amour”, de Resnais.
            Lembro-me que, sobre esse último filme, Paulo Emílio Salles, uma das pessoas neste país, a sua época, que mais gozavam de respeito quanto a sua opinião pessoal sobre cinema, disse numa palestra aqui, exibindo a fita de Resnais para um público grande, que “estamos diante de uma obra prima”. No livro de Ruy Castro há uma referência a Paulo Emílio quanto a esse filme de Resnais, que não a compatibiliza muito bem com a que ora se registra. Teria dito outra coisa de “Hiroshima...”, não tão recomendável.
            Quanto ao cinema novo, Moniz repete o que particularmente sempre achei, ou seja, que, no frigir dos ovos, nada trouxe de considerável valor à cinematografia brasileira.
              Ao manusear o livro assim que o adquiri, fui ler a resenha sobre “Os pássaros”, (The birds), de A. Hitchcock, pois, quando vira esse filme, comentei, para perplexidade de vários amigos, que não gostara dele. Moniz não diz exatamente isso em seu comentário, mas ressalta que se admirou do elenco escolhido por Hitchcock, com Rod Taylor e “Tippi” Hedren nos papéis principais, esta lhe parecendo, em certos momentos, um traço mal caracterizado  de Grace Kelly ou com pretensões disso. Por linhas transversas, Moniz ressalta um pormenor que é bem representativo de suas restrições a esse filme, embora em momento algum tivesse afirmado não o ter apreciado, ele que era um “hitchcockiano” de carteirinha.
            Não gostei de alguns artigos de Moniz. Analisando “8 e ½”, de Fellini, pareceu-me bem menos abrangente ou mais pobre do que no restante das obras analisadas. Surpreendeu-me um pouco sua referência às qualidades cinematográficas de “La strada” (A estrada da vida), também de Fellini, considerando-a como a segunda obra mais importante da filmografia de Fellini (ou assim o insinua em certo momento). Tive minhas paixões por “La strada” até que vi o filme, que achei meio caricato, com Gelsomina (Violeta Massina) e Zampano (Anthony Quinn) não muito bem em seus papéis. Há certamente uma legião de pessoas que, ao lerem este comentário, pedirão ao editor deste jornal a minha cabeça num prato. Minha paixão por essa fita resultava de minha leitura do “script”, de Fellini, prefaciado por José Lino Grünevald, que é uma beleza e revelador de um dos grandes momentos de Grünevald como crítico. O “script” é melhor que o filme, o que nem sempre é a regra.
            Outro fato que me causou certo espanto, à leitura do livro, é saber que Moniz Viana não foi devoto de Ingrid Bergman. Moniz constitui-se uma exceção a nível mundial. Bastaria citar, nos papéis desempenhados por Ingrid, o que fez em “Casablanca”, para consagrá-la como uma das maiores atrizes de todos os tempos. Mas ninguém é perfeito.
            Outra opinião expendida por Moniz é sobre “Sabrina”, que ele diz que, em matéria de comédia, só “O pecado mora ao lado” perde para esse filme, que teve grandes estrelas do cinema no elenco, Humprey Bogart, William Holden e Audrey Hepburn. Bem, não tenho preferência nem por um nem por outro. Ambos são de qualidade média, a rigor. Não vejo que Sabrina possa ser considerado melhor que o outro, como quer Moniz.
            Achei também, para finalizar, que, na crítica “A um passo da eternidade”, que, agora e só agora me dou conta, foi dirigido por Fred Zinnemannm, que, antes já havia dirigido “Matar ou Morrer”, com referência ao qual Moniz destaca o papel desempenhado por Gary Cooper, que particularmente considerei e considero pífio (um delegado amedrontado por três patetas que saltam numa plataforma de trem indigitados como temíveis bandoleiros, Gary Cooper os liquida em três minutos com certeiros tiros – então não eram assim tão temíveis) – na crítica a “A um passo da eternidade” Moniz esteve simplesmente soberbo.
            Mas o livro é riquíssimo em informações sobre grandes filmes e o prefácio de Ruy Castro é excelente.


No comments:

Post a Comment