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Thursday, August 1, 2013

MARLEY, O WILL EISNER TUPINIQUIM: desenhista exímio, realizou há algum tempo a façanha de transformar em quadrinhos uma crônica de Flávio Cardozo. - por Hamilton Alves

Sérgio Augusto, num recente artigo publicado na BRAVO!, declarou que o substituto (ou sucessor) de Eisner, nos quadrinhos, é Art (Arthur) Spiegel. Ele diz isso (logo pensei) porque não conhece os desenhos de Marley Tânis Cardoso, um oficial da Polícia Militar, profissão que abraçou para ter o direito de viver dignamente como todo mundo, mas cuja vocação é o desenho. E nisso Marley é tão bom quanto Eisner (que o diga Tércio da Gama que é seu sogro, Flávio Cardozo, de quem narrou uma crônica em quadrinhos ou Silveira de Souza, que fez os balõezinhos da história).
Alguém, vendo os desenhos de Marley (acho que foi Tércio) – disse-lhe que tinha muita semelhança com os de Eisner. A essa altura, Marley não sabia da existência de Eisner nem que fora autor de uma história policial (ou de um herói de história em quadrinhos), The Spirit, com a qual obteve sucesso praticamente em todo o mundo. No Brasil, a partir de certo tempo, tornou-se coqueluche, a ponto de Spirit ser o herói preferido de grande número de aficionados desse gênero de literatura.
Informado da existência de Eisner, Marley procurou, desde então, aprofundar-se em seu trabalho, até que trocou duas ou três cartas com o famoso artista americano. Sabia que de alguma forma Marley tinha entrado em contato com Eisner, mas sua mãe, esposa de Tércio, num dia desses, me contou a respeito das cartas trocadas por ambos, em que Eisner disse a Marley que seu trabalho era muito bom e que devia continuar a produzi-lo.
Mas a não ser a crônica de Flávio, que narrou com belos quadrinhos (tão esmeradamente desenhados como o próprio Eisner o faria), parou sua atividade. Esteve envolvido num concurso público para o cargo de oficial da Polícia Militar.
Lá está hoje brilhando. É assessor jurídico do Comando do Corpo de Bombeiros.
Bem sucedido funcionalmente (sua meta é ser Juiz ou Promotor), mas seu lado artístico apagou-se ou está provisoriamente apagado.
Pretende voltar ao desenho. Ou, na verdade, nunca deixou de desenhar. Nas horas vagas, de ocium cum dignitataem, desenha. Não de forma narrativa, mas desenha qualquer coisa que lhe pedem. Ou lhe vem à cabeça.
É claro que Desterro não é lugar (ou o espaço) adequado para uma carreira de artista.
Ricardo Hoffmann, certa vez, conheceu um guru, que lhe recomendou:
“Se você quer ser escritor não é aqui que você conseguirá sucesso”.
Ricardo preferiu ficar na Ilha, mesmo certificando-se, de antemão, que poderia fazer uma trajetória de gênio, que não lhe dariam a mínima. É ao que estão condenados pequenos e grandes artistas. quem conseguiu se salvar desse triste fadário foi Cruz e Souza. Mesmo assim teve de penar pelo Rio e pelo interior de Minas, de onde veio de trem de volta ao Rio, morrendo, ao que se conta, no curso da viagem. De miséria ou de fome. Ou das duas coisas. A tuberculose o matou. A doença foi fruto de suas privações. Foi tarde demais que se reconheceu nele o maior simbolista do País. Roger Bastide o considerava do nível dos grandes simbolistas do mundo.
Mas voltemos ao Marley.
Deu-me uma cópia de seus quadrinhos (ou da história sobre uma crônica de Flávio Cardozo). Quando me deparei com esse trabalho, fiquei simplesmente pasmo. Era a nova versão de Will Eisner.
um grande artista como Eisner teria habilidade para desenhar essa narrativa.
As figuras de Marley são estonteantemente belas. Não foi à toa que Eisner lhe respondeu as cartas e lhe previu um futuro radioso no caso de seguir sua vocação artística. Não fora isso, Eisner, obviamente, não lhe redigiria uma única linha. Não perderia tempo com quem não revelasse talento.
Mas que é que sabe, entre nós, desse feito de Marley? Alguns gatos pingados, como sempre.
Ele sabe que, confinado à Ilha, não terá a menor chance de impor sua arte. Ou ganhar a vida com ela. Ainda que venha a colaborar num jornal (mesmo de outro centro), estará condenado a ser contemplado comcachêsridículos, como é notório ocorrer com outros artistas.
Sair da PM para um futuro incerto nos quadrinhos não lhe desperta o ânimo. Mais vale um pássaro na mão que dois voando, é o sábio.
Mas há outro que ensina: “quem não arrisca não petisca”.
De uma certa forma, nascemos numa das cidades mais belas do planeta (a Ilha de N. S. do Desterro, desgraçadamente chamada ainda de Florianópolis: Floriano Peixoto é alagoano. Mandou para , no início de seu governo, Moreira César para matar nossa gente, inclusive um bisavô meu, José Liberato Bittencourt), mas pouco desenvolvida do ponto de vista cultural.
De modo que, por aqui, não haverá muita chance para um artista da envergadura de Marley. A prova disso é que tem sido até agora um ilustre desconhecido. Fez uma única historinha em quadrinhos (a crônica referida do Flávio) e depois disso recolheu-se ao silêncio. Ou ao olvido.
Como abrir-lhe uma porta para que, de novo, mostre seu trabalho?
Como fazer circular sua HQ mencionada, em que se mostra ao nível de Eisner?
Haverá quem se interesse em abrir-lhe espaço?
Garanto que Marley faria muito sucesso.
Enquanto a sorte não o bafeja, Marley, formado em direito, tenta abrir espaço como oficial da PM e, mais tarde, quem sabe, nos quadros da Magistratura ou do Ministério Público.

A não ser que tome coragem, como tantos outros, que resolveram seguir seu destino nem que fosse comendo o pão que o diabo amassou, e procure cantar em outra freguesia, Marley, a meu ver, seguirá uma carreira burocrática, em detrimento de seu grande talento de artista.
   

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