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Sunday, September 22, 2013

A ALMA DE ODETTE - Hamilton Alves


Há uma frase de Edmund White, que escreveu uma pequena biografia de Proust, que diz o seguinte: “O amor de Swann por Odette não era um tributo à alma dela; a alma dela era banal”.
Acho que Proust não endossaria essa frase.
À margem desse pensamento, anotei: “a grande paixão é uma doença, ignora tudo, passa por cima de tudo. Dane-se a alma; que seja banal pouco importa”.
Quando uma pessoa ama ou se apaixona, não há outra consideração a fazer ou outra qualquer coisa a ser levada em linha de conta que não seja exclusivamente o objeto dessa paixão (ou a pessoa envolvida).
Psicólogos já o afirmaram, com muita razão, que a paixão é uma espécie de patologia da alma, que cega, a tal ponto que tudo é deixado de lado, seja o que for, para dar lugar unicamente a esse sentimento avassalador.
O caso de Swann em relação a Odette de Crécy não é único nem mesmo em termos literários. A paixão mais obsessiva de um homem por uma mulher foi de Phillip por Mildred na magnífica novela “Servidão Humana”, de Sommerset Maughan, em que um homem altamente qualificado, estudante de medicina, amante das artes, de uma alta linhagem, empolga-se por uma balconista de um “pub” londrino. No primeiro encontro que teve com ela, admirou-se que um amigo, que o levara a esse “pub”, tivesse enamorado dela. Ou revelasse simpatia por ela. Achou-a sem encanto algum que justificasse o interesse do amigo por ela. Pouco tempo depois, cai no mesmo alçapão, atraído não por Mildred, mas pelo local, que lhe pareceu aprazível. Nessa ocasião é ela que lhe vem atender. A partir de então se estabelece uma relação com Mildred da qual Phillip consegue se desvencilhar, mas a que preço!
Os atos de baixeza moral que Phillip incorre nessa relação são incompatíveis com qualquer criatura que tenha o mínimo senso de dignidade. Ou de amor próprio. Mas se submete a todas as exigências, a todas as provas de vilania de Mildred. Sentia que, sem ela, não era capaz de continuar a existir. Chegou a ponto de querer se suicidar, como forma de escapar aos seus tormentos.
Submeteu-se até ao patrocínio de uma viagem que faria com outro amante, sabendo que não sentia nada por ele. Esse amante (ou presumido tal) vinha a ser amigo de Phillip. O mesmo por cujo intermédio veio a ter contato com Mildred.
Quem é que vai cogitar se Mildred ou Odette eram portadoras de almas banais?
Que fossem banais. E daí?
Até o detalhe de uma mulher ser possuidora de uma alma banal piora o quadro do homem que se apaixonou por ela. A paixão torna-se, parece, ainda mais incontrolável.
Ao apaixonado o aspecto da banalidade de uma mulher lhe é tão indiferente quanto sua própria sombra.
Odette de Crécy e Mildred retratam bem até onde uma mulher pode levar um homem à loucura.

(maio/08)


                                   


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