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Thursday, September 26, 2013

A RENÚNCIA DE SARTRE - Hamilton Alves

                                               
Não quero de modo algum desfeitear o merecimento de Vargas Llosa por ter recebido o prêmio Nobel de literatura das mãos do rei da Suécia, empertigado, metido numa fatiota preta, com gravata de borboleta branca e uma camisa luzidia igualmente branca, parecendo uma ave emplumada.
Ali estava ele feito um dom João de Salão para receber a honraria, representada por 1,4 milhões de dólares, o que é uma grana que, à primeira vista, pode assustar, mas que, sem dúvida, enche de alegria uma conta corrente de qualquer cristão.
Saramago foi recebê-lo, se não me falha a memória, em traje também de gala, de smoking. Só lhe faltou ter comparecido de cartola, como era, antigamente, o complemento desse traje.
Não sei como Garcia Marques se apresentou para idêntica solenidade.
Lembro-me, nessa altura, de um escritor que o recusou – Jean Paul Sartre, o nunca assaz louvado Jean Paul Sartre.
Como explicar-se a renúncia de Sartre à tanta grana?
Simone de Beauvoir explicou que Sartre não gostava de dinheiro.
O que faria ele com 1,4 milhões de dólares? Ao tempo em que o ganhou, a mufunfa era menor, mas devia mais ou menos equivaler ao montante atual.
O que é que um homem da altura intelectual de Sartre faria com tanto dinheiro?
Não sou capaz de imaginar.
Vivia com a cabeça nas nuvens, elucubrando sobre teorias filosóficas, até dar com uma que o celebrizou – a do existencialismo, que corresponde à ideia da contingência e, por consequência, por ela, segundo ele, o homem está condenado a ser livre.
Teoria que foi mal interpretada em nosso país, por exemplo, quando um compositor de carnaval lançou a marchinha, interpretada por Emilinha Borba, da “Chiquita Bacana, que se veste com uma casca de banana nanica, existencialista, com toda a razão, só faz o que manda o seu coração”.
A teoria existencialista de Sartre envolvia um humanismo, do homem contingente e, portanto, condenado a ser livre. Com isso, o destino estava em suas mãos.
Um pouco falso isso, mas afinal era a teoria de um gênio.
Sartre deixou o mundo em suspenso quando se anunciou que recusara o Nobel.
Tantos o querem, tantos o disputam, Sartre foi diferente: deu uma banana para o rei da Suécia e para uma considerável fortuna.


(dez/10).                                             

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