Não
fui nem sou adepto da literatura policial, mas tenho uma boa quilometragem de
leitura de algumas obras, consideradas até primas, de grandes autores do
gênero, como Agatha Christie, com seu Hercule Poirot (um homem pequenino,
agasalhado até as orelhas, e do qual tudo que se podia ver era a ponta
avermelhada do nariz e as pontas de um bigode curvo, voltados para cima),
Simenon com seu Maigret, de Dashiell Hammett com seu Samuel Spade, que tinha o
maxilar longo e ossudo, seu queixo em V proeminente sob o V mais flexível da
boca. Os olhos amarelos pardos eram horizontais. O motivo V era retomado por
espessas sobrancelhas saindo de duas rugas gêmeas sobre o nariz adunco e o
cabelo castanho claro descia das têmporas altas e achatadas, em ponta sobre a
testa.
Essa
descrição de Sam é feita logo no início do clássico “Falcão Maltês”, que deu
origem a outro clássico, esse do cinema, “Relíquia Macabra”, com Humprhrey
Bogart à frente, no papel de Sam Spade. Obviamente que um sujeito com esses
traços está longe de ser bonito. Mas isso, para o fim desta crônica, não vem ao
caso. Um detetive não é, a rigor, um homem bonito. Como não o é Poirot, tal como
o descreve Agatha Christie também no início do clássico “Assassinato no
Expresso Oriente”. Conan Doyle, ao que sei, não descreveu fisicamente o
personagem Sherlock Holmes, a não ser quanto à forma de se trajar e ao uso do
cachimbo. Assim como não se sabe (ao menos não sei) de que Edgar Allan Poe
tivesse dado nome a um personagem único de suas novelas policiais, gênero que
criou. Chesterton criou Padre Brown, um detetive literariamente muito
conhecido, embora tivesse particularmente pouca ou nenhuma convivência com ele.
Borges e Byoi Casares também escreveram novelas policiais, mas segundo sei não
criaram um personagem definido e característico como os citados.
Refiro-me
a alguns detetives notórios que me vêm à lembrança; há outros, como se sabe.
Mas
por que, afinal, essa referência a alguns dos personagens clássicos da
literatura policial?
Leonardo
DiCaprio banca o detetive num filme que está em cartaz no momento nos cinemas
de todo o país, “Ilha do Medo” (Shutter Island), dirigido por Martin Scorcese,
um grande cineasta, que já produziu tantos clássicos em seu “tour” pelo cinema.
Num
jornal recente, o ator fala de sua participação nesse filme, de como o encarou,
do que trata e outras questões, que o levam ao mistério do desaparecimento de
uma mulher e de seu próprio mistério. Passa de investigá-la à investigação de
si mesmo.
Sam
Spade tem a cara que Deus lhe deu, como vimos pela descrição de seu criador,
que Humprhey Bogart está longe de representar. Tem traços bem diferentes do
personagem da novela.
Poderia
imaginar DiCaprio fazendo qualquer papel, menos o de detetive.
Não
tem o que os franceses chamam de “physique du role” (físico do papel).
Ou
será um detetive bem fora da linha tradicional (se é que há tradição nessa
linhagem).
Ou
em outras palavras: não convence como tal. Ou estarei muito enganado.
Em
todo o caso, porei, até ver o filme, as barbas de molho.
(março/10).
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