Estava
num café quando sem mais nem menos entrou Hemingway, com seu corpanzil enorme,
seus cabelos grisalhos, seu sorriso inigualável, me cumprimentando afetuosamente.
Dirigiu-se
à balconista, pediu uma xícara de café com leite com um sanduíche de queijo.
Aboletou-se numa cadeira. Deixou suas coisas em cima da mesa.
Hemingway
usava um casaco preto enorme, umas calças jeans, uma sacola não sei de que
material estranho onde certamente levava seus pertences.
Tive
ímpetos de me erguer de onde estava comodamente instalado para lhe perguntar
que final triste e trágico foi aquele de quando, sabedor da morte da mulher,
Henri saiu pela noite sob a chuva, curtindo uma terrível dor em “Adeus às
armas”, que Otto Maria Carpeaux descreveu como sendo a cena mais pungente que
já vira descrita numa novela.
Antes
de mim, Hemingway se levantara. Fora ao caixa. Pagara sua conta. Saíra tão
neutro como entrara, sem ninguém dar por sua presença insólita, a não ser eu,
que já me familiarizara com sua obra.
Depois
dele entrou Drummond, autor de um poema que Hélio Pelegrino disse que, quando
aluno de ginásio, percebeu claramente que ali se dava o rompimento da poesia
moderna com a tradicional – “No meio do caminho”.
Drummond
parecia neutro. Ou, digamos, alheio a tudo. Mal se comparando, era o tipo de
quem comeu e não gostou ou a imagem da indiferença por tudo e por todos.
Não
olhou nem cumprimentou ninguém. Sério entrou, sério ficou e sério abalou-se rua
afora, logo depois que sorveu uma xícara de chá.
-
Chá!... Que coisa estranha tomar chá a essa hora! – disse de mim para mim.
Sempre
lhe admirei o poema ”José”, que, a meu ver, merecia se situar entre os dez
melhores poemas do século XX em âmbito mundial, mas que a vesguice de uma
comissão julgadora, constituída pela Folha de S. Paulo, em 2000, houve por bem
de relegar para os dez melhores nacionais.
Drummond,
semelhante a Hemingway, sem dar a mínima aos circunstantes, sumiu dentro de um
carro que o aguardava.
Por
minha vez, a garçonete do café me trouxe um pacote de pães e a conta para
pagar.
Fiquei
ruminando comigo mesmo como subitamente haviam aparecido ali (ao mesmo tempo)
esses dois nomes consagrados das letras.
Até
que ouvi lá fora o ruído de uma carroça barulhenta, puxada por um cavalo
magricela. O que me alarmou um pouco no fim da madrugada. Uma chuva rala
despencava.
(julho/10).
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